Originalmente editado a 12 de Maio de 1972, eis «o álbum rock ‘n’ roll mais rock ‘n’ roll de sempre», o “Exile On Main Street” dos Rolling Stones.
O mundo viu-se a lutar contra a pandemia do Coronavírus COVID-19. Desde 2020, repetidamente estivemos sob medidas severas de comportamentos individuais e sob confinamentos, concertos e festivais foram cancelados/adiados e os espaços nocturnos fechados ou a funcionar com lotação muito limitada. Toda a indústria musical sofreu com um tempo de “suspensão” tão prolongado. Os mais atingidos foram, inevitavelmente, os artistas e agentes de menor dimensão, como as lojas de discos locais.
Caso da Megastore by Largo que abria portas no Largo do Intendente, no Nº18, e devido à pandemia encerrou definitivamente. Felizmente metamorfoseou-se para a loja A Record a Day. Podem encontrar a sua banca fixa na feira da ladra, o que sucede desde 2010 ou online, no Instagram e no Discogs. Visitem estes espaços digitais e depressa perceberão que estão cheios de raridades. Se estiverem à procura de algo em específico não hesitem em deixar mensagem.
Entre essas raridades, uma mora deste lado, o álbum do “exílio” dos Stones, favorito pessoal na discografia da maior banda de rock ‘n’ roll da história. Estávamos em 2014 quando consegui juntar à colecção este repress britânico algo misterioso (não se trata do original de ’72, mas é possível apurar esse ano de edição), que ostenta o matrix COC 69100 A EG ALLEN. A “A Record a Day”, do Nuno Efe, e o LxMarket juntaram-se para organizar a “1ª Feira do Vinil LxMarket”. E, no dia 23 de Março de 2014, no Pavilhão Brasil, no LxFactory, o Nuno estava lá presente, naturalmente, com uma banca sua.
É ele que recorda: «Nessa altura, estava ainda longe de pensar na Megastore by Largo. Essa nasceu só em 2016, fazendo parte da Largo Residencias, daí o nome». Debatemos um pouco a origem misteriosa do disco e o Nuno garantiu logo não ser a edição original (o que também se podia perceber pelo preço) e já não ter os postais que acompanhavam as edições britânicas de ’72. Também me garantiu que o vinil estava em condições impecáveis, mesmo que a capa já tivesse levado porrada. E assim foi. Duplo LP com masterização cheia de dinâmica e muita amplitude no som. Impecável, Efe!
Quanto a “Exile On Main St.” bastaria dizer que, na discografia da banda, é um dos álbuns favoritos de Keith Richards e um dos menos favoritos de Mick Jagger para se perceber muita da estética e vibração do disco. Além dos êxitos colossais que os colocaram em estádios até aos dias de hoje, os Stones faziam blues com uma acidez inigualável. Este álbum não tem nenhum desses super hits que a banda produziu e toda a gente sabe cantar. Bom, talvez “Tumbling Dice”…
Contudo tem temas densos, pesados mesmo, com um trabalho de guitarras que ajuda a explicar o estatuto da dupla Richards/Taylor. Aliás, se nos cingirmos à guitarra, este álbum é a quintessência dos Rolling Stones. O “pirata” Keith Richards não dá tréguas neste disco, acutilante, vibrante, com groove e feeling – pode mesmo dizer-se que este é um dos grandes trabalhos de guitarra dentro do rock/blues, um daqueles pilares que sustentam o Olimpo Eléctrico do rock ‘n’ roll. E depois o trabalho de slide guitar de Mick Taylor é uma herança viva de Robert Johnson.
As más línguas [Percebem? Stones? Línguas? Ok, piadola fatela] sempre referiram que a relação entre ambos os guitarristas não era nada famosa, e a verdade é que neste álbum parece sentir-se uma competitividade extrema entre as linhas de cada um e isso dá uma vitalidade fantástica às canções.
Mas os choques de personalidade não se resumem aos guitarristas, Richards e Mick Jagger também não andavam propriamente em convívio harmonioso. O vocalista havia casado e estabilizara um pouco os seus comportamentos, enquanto o incorrigível guitarrista continuava a viver no limite e a consumir excessivamente heroína. Essa dependência acabaria mesmo por provocar um afastamento de Richards do centro de decisões do grupo.
Algo assumido pelo próprio na sua biografia “Life” (que inclui ainda detalhes deliciosos sobre o trabalho de estúdio deste disco). Nos álbuns seguintes Jagger assumiu um controlo maior de produção, tendo afastado a banda da sonoridade aqui presente. Assim, “Exile On Main St.” tornou-se o fim de uma era nos Rolling Stones.





Gravado entre o sul de França [Nellcôte] e Los Angeles, onde houve um intenso processo de overdubs às sessões iniciais, o álbum foi ganhando uma extensão considerável até ter-se tornado um LP duplo que trilha em passos de gigante a história do blues ao rythm and blues, do gospel ao country, do soul ao rock, numa esquizofrenia eléctrica fascinante. E ainda tem muito roll.
Parafraseando Keith Richards, «Everyone talks about rock these days; the problem is they forget about the roll», não é o caso destes Rolling Stones e deste magnífico trabalho originalmente editado no dia 12 de Maio de 1972.
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