Analisamos os quatro temas já estreados de “72 Seasons” e, tudo somado, parece que podemos esperar muitas coisas boas do próximo álbum dos Metallica.
Com 12 faixas e totalizando 72 minutos, “72 Seasons” vai chegar a todos os lugares onde se pode consumir música na sexta-feira 14 de Abril de 2023, anunciaram os Metallica em press release lançado no dia 28 de Novembro de 2022. Produzido por Greg Fidelman, em conjunto com James (Hetfield) e Lars (Ulrich), “72 Seasons” já está disponível para pré-venda em CD, vinil preto duplo de 140 gramas, duas variações de vinil em cores diferentes e de forma digital na Met Store. Cada pré-venda dará direito a uma faixa digital instantânea da primeira canção que foi lançada, “Lux Æterna”.
«A arte gráfica foi novamente concebida e dirigida pelo nosso grande amigo, o premiado designer David Turner, conjuntamente com a sua equipa. O David, que ganhou um Grammy pelo seu trabalho no “Death Magnetic”, é o rosto por trás do visual de todos os nossos lançamentos recentes, incluindo “Through The Never”, “S&M2” e “Hardwired”», referia o press release e, se estão a pensar no significado do título do disco, o comunicado vinha completo com algumas palavras de Hetfield a esse respeito…

«72 Estações. Os primeiros 18 anos das nossas vidas, que formam nosso verdadeiro ou falso eu. O conceito de que nos disseram ‘quem somos’, através dos nossos pais. Uma possível classificação em torno do tipo de personalidade que somos. Acho que a parte mais interessante disto é o estudo contínuo dessas crenças centrais e como isso afecta nossa percepção do mundo hoje. Grande parte da nossa experiência adulta é reencenação ou reacção a essas experiências da infância. Somos prisioneiros da infância ou então libertamo-nos de todas essas amarras que carregamos connosco».
A apresentação do álbum veio acompanhada do anúncio de uma tour mundial que estará na estrada a promover o disco durante o ano de 2023 e 2024. Ainda não existe nenhuma data confirmada em Portugal, mas os Metallica não costumam visitar a Europa e deixar o nosso cantinho de lado. Ainda no Verão passado estiveram no Passeio Marítimo de Algés. Aguardemos. E enquanto fazemos isso, vamos especular sobre o que parece prometer “72 Seasons”, a partir dos temas já conhecidos. Afinal “Lux Æterna”, “Screaming Suicide”, “If Darkness Had A Son” e “72 Seasons”, a rondar um total de 25 minutos de música, formam quase que um EP.
Diamond Head & Punk
Sonicamente, “Lux Æterna” é um blaster que tresanda a Motörhead e, principalmente, a Diamond Head. Há muito se sabe que os thrashers americanos são fanboys do lendário grupo britânico. Essa devoção, aliás, foi registada na versão de “Am I Evil?”, lado-B do single “Creeping Death” (1984) e posteriormente integrada em reedições do álbum de estreia dos Metallica. Além da malha se ter tornado um staple nos concertos dos americanos, ficava provada uma das principais inspirações sónicas de “Kill ‘Em All”. O facto de os Metallica estarem a voltar às suas raízes sónicas só pode ser encarado com esperança. Quanto a “Lux Æterna, é um tema que não pretende fazer prisioneiros.
Sem compromissos dinâmicos e sempre a soar na batata. Na verdade, se nos abstrairmos das marcas da idade na voz de James Hetfield (e falamos apenas no timbre), esta malha não deslustraria em “Kill ‘Em All” ou “Ride The Lightning”. As baterias de Lars estão bem punk, quadradas e sólidas. O rápido solo de Kirk Hammett usa vários licks de marca do shredder, mas também acompanha a intensidade propulsiva do riff. Resumindo, é uma boa malha!
“Screaming Suicide” é outro monstro de thrash metal. Quanto ao seu título, James Hetfield pede mente aberta, na abordagem ao tabu sempre associado à palavra suicídio, revelando-se compadecido. «’Screaming Suicide’ refere-se ao tabu em torno da palavra suicídio. A intenção é comunicar sobre as trevas que todos sentimos interiormente. É ridículo pensar que devemos negar que temos tais pensamentos. Num ou noutro momento, Creio que a maioria das pessoas já pensou nisso. Encará-lo é falar sobre o não pronunciável. Se é uma experiência humana, devemos poder falar sobre isso. Não estás só».
Musicalmente, a malha é um porradão! Há melodias vocais evocativas de “…And Justice For All” (estamos a pensar em “Harvester Of Sorrow”)e também do blockbuster álbum homónimo. Segue tudo em velocidade e de forma escorreita até que, pela marca dos 03:50, há um twist no tema, com uma queda abrupta e esquizofrénica até à solidificação numa clássica cavalgada de heavy metal. Isto para dizer que os veteranos músicos estão com pedalada e criatividade. No final, o tema também ostenta uma tremenda atitude punk, o que é sempre bom quando pensamos em thrash.
Um Exercício Retrospectivo
A Rolling Stone adjectivou como épico o terceiro tema a ser apresentado: “If Darkness Had A Son”. Não iríamos tão longe, mas o seu riff carregado de balanço, com os locomotivos palm mutes, sente-se quase como um exercício retrospectivo de toda a carreira dos Metallica, com agressividade e melodia, cruzando aspectos vetustos da era “Ride The Lightning” com o experimentalismo emanado pelos “Load”, passando pela eficácia radio friendly do Black Album. E depois, aquele ‘chug’ de guitarras… Não há muitas bandas que consigam usar afinação standard e, ainda assim, soar verdadeiramente pesadas.
As harmonizações vocais de James Hetfield e o solo de Hammett são viciantes. A batida de Ulrich, com o alcance ampliado pela intratável parede de graves de Trujillo, possui um trabalho de bombo ao nível do melhor que o, muitas vezes desconsiderado, baterista já nos mostrou ao longo da carreira. Aliás, através das execuções de cada músico e do latente trabalho apurado de composição, os Metallica parecem renascidos naquilo que se vem a ouvir deste disco.
Sendo racional, talvez haja em tudo isto uma certa dose de wishful thinking ou um incontrolável hype diante de uma banda que, para o bem e para o mal, marcou de forma indelével o imaginário de qualquer headbanger. Mas depois uma malha como a que partilha o título do álbum surge e a racionalidade evapora-se. “72 Seasons” é o grande malhão dos quatro até aqui conhecidos! Melodicamente, demora mais a emancipar-se que os singles anteriores, mas agarra-nos de forma mais perniciosa: através da velocidade das guitarras e das baterias de Ulrich que remetem imediatamente para os dias de glória do thrash nos anos 80. Aí cativos, começamos então a ver surgir os elementos da última década dos Metallica.
Os quase oito minutos de duração de “72 Seasons” passam rapidamente. Isto acontece graças, em grande parte, à estrutura alternada do tema que mistura a intensidade de intransigente velocidade rítmica com grooves mais descontraídos. Se o refrão fosse um pouco mais desenvolto melodicamente, estaríamos diante de uma das maiores pérolas da discografia dos Metallica. Ainda assim, os fluxos de tensão que emergem a antecipar os solos de Hammett, tal como os versos e a ponte da malha, são memoráveis.
Um pensamento sobre “Metallica, Tudo Sobre 72 Seasons”