Deafheaven

Deafheaven, Sunbather & São Lucas

Os Deafheaven e Jack Shirley criaram uma edição remisturada e remasterizada do fracturante “Sunbather”, para celebrar a passagem de uma década de um dos álbuns que, para o bem e para o mal, se tornou um dos mais importantes do universo do metal mais extremo.

«Eu vim lançar fogo à terra, e que tenho eu a desejar se ele já está aceso? Mas devo ser baptizado num baptismo; e quanto anseio até que ele se cumpra! Julgais que vim trazer paz à terra? Não, digo-vos, mas separação. Pois de ora em diante haverá numa mesma casa cinco pessoas divididas, três contra duas, e duas contra três; estarão divididos: o pai contra o filho, e o filho contra o pai; a mãe contra a filha, e a filha contra a mãe; a sogra contra a nora, e a nora contra a sogra».

O Evangelho Segundo São Lucas (tal como Segundo São Mateus), possui estes pungentes versículos no capítulo doze. Essa metáfora sobre a novidade abrasiva e transformadora de Jesus, que pode ainda ser interpretada como o sofrimento que o espera e o anseio de ser Cristo (ungido, baptizado). A terra, a matéria, e o espírito humano, em fogo e tumulto. Uma advertência aos que pretendem aderir à mensagem do rabi galileu, a discórdia que se irá interpor entre irmãos. A espada entre os que adoptam a mensagem e os que a rejeitam. Uma espada figurativa, espiritual (entenda-se).

Gravado, editado, misturado e masterizado por Jack Shirley, nos Atomic Garden Studios, em East Palo Alto, CA, “Sunbather” teve efeitos similares. No disco, os Deafheaven tiveram a ousadia de redefinir, sónica e esteticamente, as fronteiras do black metal. Fundindo a tipologia abrasiva das guitarras do género, com a contemplatividade e o impressionismo do shoegaze. A banda tornou-se num dos maiores exemplos de afirmação de identidade na última década, mas o disco trouxe a discórdia e colocou «numa mesma casa cinco pessoas divididas, três contra duas, e duas contra três».

“Sunbather” possui um som que é simultaneamente intenso, físico e etéreo. O contraste entre os vocais ásperos e os blast beats de black metal e as guitarras cintilantes e atmosféricas é particularmente notável. Dinâmico e atmosférico: move-se entre secções intensas, impulsionadas por batidas de explosão e momentos mais calmos e reflexivos. Estes contrastes criados pelos Deafheaven acrescentam profundidade emocional à música, criando uma viagem para o ouvinte que atenta em letras que exploram temas de identidade, alienação e a busca por significado na vida. “Sunbather” é muitas vezes visto como uma reflexão sobre a condição humana e as lutas que os indivíduos enfrentam num mundo complexo e, imensas vezes, hostil.

A própria capa rosa e dourada do álbum, trabalho de George Clarke, tornou-se icónica, vincando as escolhas estéticas, tanto visualmente como musicalmente, que contribuem para a experiência global de “Sunbather”. Todavia, se muitos elogiaram o álbum pela sua inovação, profundidade emocional e a capacidade da banda de ultrapassar os limites do metal, muitos outros, puristas, criticaram-no por se desviar das normas tradicionais do black metal. A inclusão de elementos shoegaze e a acessibilidade geral do álbum levaram a debates sobre a sua autenticidade e direito de admissão canónica.

Para o bem e para o mal, os Deafheaven e “Sunbather” desempenharam um papel significativo ao levar o blackgaze a um público mais vasto. O sucesso do álbum ajudou a abrir caminho a outras bandas que exploram fusões de género semelhantes, contribuindo para a diversificação do panorama do black metal, em particular, e do metal, em geral.

10th Anniversay Remix/Remaster

«Honestamente, foi o ‘Sunbather’ que nos deu uma carreiraAntes disso, já andávamos a trabalhar no duro e tínhamos sonhos grandiosos, mas foi esse disco que nos transformou numa banda a sério. Foi graças a esse álbum que acabámos por conhecer muitas pessoas ao por todo mundo que, depois, mudaram as nossas vidas e nos colocaram no caminho que estamos a trilhar agora», são as palavras de Kerry McCoy, guitarrista e membro fundador dos Deafheaven, sobre o sucesso monumental do álbum que os tornou conhecidos em larga escala.

Para celebrar o seu impacto, os Deafheaven alargaram as comemorações do décimo aniversário do álbum “Sunbather” ao longo de 2023, com destaque para uma reedição discográfica, depois da sua reinterpretação integral no Roadburn.

A banda oriunda de São Francisco disponibilizou uma versão remisturada e remasterizada do seu icónico segundo LP a 17 de Novembro de 2023, via Deathwish Inc. O produtor Jack Shirley tratou de aprimorar o áudio das sete faixas do álbum, que estão alojadas num pacote de luxo, que inclui uma capa dobrável com detalhes em verniz brilhante e dois inserts com fotografias inéditas.

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