Mais introspectivo e sóbrio que o seu antecessor, “Ultraviolence” sente-se mais clássico e despido de artifícios de produção, tornando as personagens e a lisergia suburbana de Lana Del Rey mais viscerais.
De vez em quando, há artistas como diamantes. Cristais raros e únicos, lapidados ou em bruto, que em toda a sua verdadeira natureza e essência se distinguem sempre que vislumbrado e apreciado cada contorno do seu esplendor. Uma dessas artistas é Lana Del Rey. Quando, nos primeiros meses do ano, anunciou o lançamento de “Ultraviolence”, mais do que reforçar uma enorme onda de curiosidade e expectativa, Lana Del Rey deu uma garantia: “Born To Die” não seria um ponto final na sua carreira.
Primeiro chegou “Tropico”, curta-metragem realizada por Anthony Mandler e cuja produção esteve sob a supervisão de Rick Rubin. É como que um videoclip “gigante” para os temas “Body Electric”, “Gods and Monsters” e “Bel Air”. Lana Del Rey criara uma agitação tremenda ao anunciar, no seu Twitter oficial, que a curta-metragem que estava a desenvolver seria o seu projecto de despedida (“farewell project” nas palavras da artista). Contudo, na estreia de “Tropico” acabou por anunciar que “Born To Die” seria sucedido por “Ultraviolence”.
A cantora, que tempos antes confessara, em entrevista à Vogue, não ter quaisquer perspectivas de gravar um novo álbum, encerrou assim mais um longo e impetuoso debate em torno da sua trajectória, habitualmente polémica e controversa. E, enquanto ainda restavam dúvidas quanto à permanência e continuidade do alter-ego de Elizabeth Grant, “Ultraviolence” ganhava vida e formas num clube de strip, em Queens.
“Ultraviolence” foi editado, pela Interscopre/Polydor, do grupo Universal Music, no próximo dia 17 de Junho de 2014. CD normal e deluxe, vinil, digital ou caixa de coleccionador, uma questão de escolha.
Conheci-o (Dan Auerbach) em Nova Iorque, jantámos e fomos até um clube de strip em Queens. Uma semana depois fui até Nashville e gravámos algumas músicas
Lana Del Rey, The Sun
Com a inclusão do líder dos Black Keys, Dan Auerbach, na equipa de produção, a dimensão e o potencial sonoro de “Ultraviolence” muda consideravelmente de direcção e estilo em comparação ao precedente “Born To Die”. A composição e os arranjos, que anteriormente eram maioritariamente sintéticos, electrónicos e emulados, são agora essencialmente mais suaves e ténues, abrindo tempo e espaço a uma instrumentação mais clássica e tradicional, onde a presença de guitarras leves e distantes alternam com ecos de solos marcantes. O que inicialmente seria apenas um “get together” de alguns dias, em duas semanas tornou-se num álbum completamente escuro e sedutor.
Um ambiente nostálgico e etéreo que cobre todo o romantismo e misticismo de uma nova colecção de canções incrivelmente tristes e belas. Tão melancólicas e sublimes quanto a encantadora mistura de fragilidade e rebeldia de Lana Del Rey. Uma voz que se solta em segredos e confissões de uma alma eternamente ferida e amargurada. Um conjunto de sons e tons que se envolvem nos traços e desenhos de um corpo instrumental cirurgicamente aperfeiçoado. Amor, dissabor, fortuna e infortúnio. Mais aventuras e desventuras de pessoas e relações irremediavelmente perigosas, proibidas e fatais. Em toda a sua criação, “Ultraviolence” não só representa um novo capítulo absolutamente tentador e convincente na segunda vida de Elizabeth Grant, como é a confirmação e o regresso da verdadeira identidade de Lana Del Rey.
A diva melancólica garante: «Eu conto histórias exactamente como as vivi. Eu canto o que vivi. Não há outra receita». Sobre o trabalho com Lana Del Rey, Dan Auerbach confessou à Rolling Stone: «As demos dela eram tão boas e as suas canções tão fortes, que só queria ter os meus músicos e capturar o meu som nas suas canções. Não queria estragar nada. O álbum inteiro é uma banda de sete elementos com ela a cantar ao vivo».
Odiada por uns, amada por tantos outros. De todos os atributos que são instantaneamente reconhecidos em Lana Del Rey – carisma, enigma, diferença, presença – certamente um dos mais brilhantes e fascinantes é a forma surpreendente como, gradualmente, se vai reinventando. Musicalmente, “Ultraviolence” não é, exactamente, igual a “Born To Die”. “Born To Die” não foi, exactamente, igual ao álbum de estreia. E, por sua vez, Lana Del Rey não é, exactamente, uma artista igual a tantas outras.
Numa era que persiste e na qual a cultura pop depende quase única e exclusivamente do seu próprio passado, Lana Del Rey é o antes, o agora e o depois do sonho americano. Não existe maior representação de modernidade e classicismo do que a deslumbrante combinação de inocência e fatalidade da sua personalidade. Uma imagem de incontornável encanto e talento, sincero e autêntico, numa história que continua imparável e indecifrável ao sabor do mais belo e trágico romance. Mais do que um cristal, um puro diamante.
De Nashville a New York
O estúdio onde decorreu o grosso do trabalho de “Ultraviolence” é o estúdio do próprio Dan Auerbach. Os Easy Eye Sound destacam-se imediatamente pela sua rara consola, uma Quad-Eight, de 1969, ou os mixers Altec 16567A. Como é facilmente dedutível, pelos trabalhos de Auerbach, abunda o equipamento vintage, como dois raríssimos Daniel Flickinger 351-1 Program Equalizers.

A colecção de microfones não é menos impressionante: os dinâmicos Electro Voice 668, para guitarras, por exemplo, ainda que Auerbach confesse ser um fã do Beyerdynamic M160 (sendo o que usa mais vezes). Um Unidyne 57 é, usualmente, aplicado para baixo ou tarolas. Como overheads é recorrente ver-se modelos como o AEA R44, o RCA 77 ou o KM184, e para captar bombos são usados modelos como o Beyer M88 ou o Shure 55SH. Se pensarmos nos timbres escuros destes modelos, então começamos a compreender muito do som de bateria de “Ultraviolence”. Na vocal booth, os modelos mais recorrentes como alternativa aos Neumann são um Electro Voice RE15 ou um Altec 1567A.
Tendo viajado entre Nashvile e New York, “Ultraviolence” visitou um estúdio para lá de mítico: o Electric Lady, desenhado por John Storyk e construído por… Jimi Hendrix. Com várias salas, o estúdio alberga consolas tão lendárias como uma Neve 8078 ou uma API 3288, uma Neve VR (modelada por Tom Elmhirst) e uma Neve Genesys (modelada por John O’Mahony), além de uma SSL 9080. Venha o diabo e escolha…