Lana Del Rey, Born To Die [Paradise Edition]

Lamento trágico sobre o colapso da iconografia dos Estados Unidos da América, “Born To Die” é o arrasador álbum de estreia de Lana Del Rey.

A pele de diva parecia servir-lhe ainda justinha, num tom sedutor, caloroso, mas distante, um one night stand com a realidade, numa volúpia de honestidade até um clímax de vontade em repetir vezes sem conta a audição. Os singles (e houve muitos em “Born To Die”) ficaram rapidamente conhecidos, rodados quase em loop pelas TVs e rádios, os temas restantes trazem e completam o ramalhete num álbum perfeito – que junta novos desesperos e velhos amores.

Um ambiente nostálgico e etéreo que cobre todo o romantismo e misticismo de uma nova colecção de canções incrivelmente tristes e belas. Tão melancólicas e sublimes quanto a encantadora mistura de fragilidade e rebeldia de Lana Del Rey. Uma voz que se solta em segredos e confissões de uma alma eternamente ferida e amargurada. Um conjunto de sons e tons que se envolvem em traços e desenhos de um corpo instrumental cirurgicamente aperfeiçoado. Amor, dissabor, fortuna e infortúnio. Mais aventuras e desventuras de pessoas e relações irremediavelmente perigosas, proibidas e fatais.

As primeiras reacções dos media foram de repulsa à clara exposição das latentes falhas do feminismo numa sociedade aclamada como civilizada, liberal e moderna. É, contudo, a forma negra e fatalista como Lana retrata a “morte de Elvis” (que nos surge em “Million Dollar Man) e pinta a bandeira norte-americana com listas de dor e sangue, através duma intuída evocação da família Kennedy, que torna fascinante o seu trabalho, até por, no final, encontrarmos ténues linhas (sim, não foi uma expressão inocente) de luz. Numa estética realisticamente fatalista, Elizabeth Grant faz-nos acolher a morte como um estranho aconchego, quando canta “Born to Die” e (como sucedia ao vivo) referencia o Salmo 51, o Miserere, “Senhor tende misericórdia”…

Numa era em que a cultura pop depende quase única e exclusivamente do seu próprio passado, Lana Del Rey surgiu como o antes, o agora e o depois do sonho americano. Não existe maior representação de modernidade e classicismo do que a deslumbrante combinação de inocência e fatalidade da sua personalidade. Uma imagem de incontornável encanto e talento, sincero e autêntico, numa história que continua imparável e indecifrável ao sabor do mais belo e trágico romance. Mais do que um cristal, um puro diamante.

A primeira tentação, ao pensar na reedição com o EP “Paradise”, era deduzir que Elizabeth Grant estaria a capitalizar o sucesso estrondoso de “Born To Die”. Possivelmente isso é verdade. A questão é que isso não significa em nenhum momento que Lana Del Rey faça qualquer compromisso na intensidade emocional que caracterizou o seu álbum de estreia. Em “Paradise” Lana Del Rey potencia ainda mais aquela imagem tipo da candura de Nancy Sinatra, mas afundada no mundo dos anti-depressivos ou capaz de dizer profanidades. Desde o violento “Ride” (principalmente a versão longa do vídeo) que somos subjugados ao poder trágico e melancólico do lamento de Lana sobre as ruínas do American Dream.

Leave a Reply