Melvins @ Vilar de Mouros, 2003 [Pro-Shot]

Em 2003, uma digressão conjunta dos Melvins e dos Tomahawk passou no Festival Vilar de Mouros. Buzz Osbourne e Dale Crover estavam a promover “Hostile Ambient Takeover”. Recorda esse concerto, onde Mike Patton surgiu como convidado, num bootleg com áudio e vídeo profissional.

É certo que os Melvins não foram a primeira banda a reconhecer as influências do heavy metal que a maioria dos músicos underground andavam a evitar desde que o punk rock “rebentou” em 1977; essa honra vai para os Black Flag e para o lendário álbum “My War”. No entanto, nenhum outro grupo surgido no underground do rock alternativo teve a ousadia de explorar tão a fundo, e com tanto impacto, o rugido lento e monolítico dos Black Sabbath.

Pelo caminho, os Melvins atingiram verdadeiro estatuto de culto e ainda provaram ser extremamente influentes, abrindo as portas às afinações baixas e às batidas arrastadas que ícones do grunge como Tad, Mudhoney e Soundgarden exploraram no início das suas carreiras. Com o malogrado Kurt Cobain a citá-los como referência a cada oportunidade, ajudando-os inclusivamente a conseguirem o seu primeiro contrato com uma editora “grande” em 1993, transformaram-se numa ponte entre as franjas mais liberais das comunidades punk e metal, que encontraram maior terreno em comum a partir dos 90s. E sim, os anos de formação coincidiram com a ascensão do rock vindo de Seattle, mas os músicos nunca abraçaram nenhuma afiliação rígida ao grunge e sempre se mantiveram prontos a trocar de pele a cada passo. 

“6 Songs”, o EP de estreia de 1986, mostrou os Melvins a oscilarem entre temas punk mais rápidos e descargas de peso arrastado e demolidor, mas em “Bullhead”, de 1991, o som gigantesco de marca registada que os tornou famosos já estava firmemente no lugar. Por um lado, provaram ser tão fáceis de reconhecer como qualquer banda da sua época; por outro, revelaram-se mais flexíveis criativamente que quase todos os seus parceiros. Vai daí, experimentaram estilos diferentes (no bizarro “Lysol”, de 1992), exploraram mais a fundo o potencial dos truques de estúdio (no “Stag”, de  1996) e até mergulharam em paisagens sonoras épicas e barulhentas (no duplo LP “A Walk With Love And Death”, de 2017).

Como se isso não bastasse, encarnaram uma variedade enorme de configurações musicais: vários vocalistas convidados (no “The Crybaby”, de 2000), dois bateristas (no “A Senile Animal”, de 2006), uma equipa rotativa de baixistas (no “Basses Loaded”, de 2016) e até ensaiaram um regresso às raízes no “Bad Mood Rising”, de 2022. Essas doses enormes de variedade e criatividade ajudaram-nos a permanecer produtivos e prolíficos durante mais de quatro décadas.

Desde que o grupo tomou forma, numa zona rural de Montesano, WA, em 1983, o cantor e guitarrista “King Buzzo” Buzz Osborne permaneceu consistentemente ao comando de um corpo de trabalho cada vez mais extenso. Dale Crover, que gravou alguns temas do “Bleach”, dos Nirvana, juntou-se à banda em 1984. O actual baixista, Steven McDonald, dos punks californianos Redd Kross, começou a tocar com a dupla de fundadores em 2015, seguindo uma longa linhagem de baixistas que vão desde um vanguardista como Trevor Dunn a JD Pinkus, dos infames Butthole Surfers.

O grupo norte-americano “aterra” em Portugal nos dias 8 e 9 de Julho de 2023, para actuações no Hard Club e no Cineteatro Capitólio, no Porto e em Lisboa, respectivamente. Naquela que é a sua primeira tour europeia em cinco anos, celebram 40 anos de um percurso exemplar e sobem ao palco em formato de trio, com Buzz Osborne na guitarra e voz, Dale Crover na bateria e Steven McDonald no baixo.

Vilar de Mouros

A única vez que, até aqui, passaram por Portugal foi no dia 20 de Julho de 2003, no Festival Vilar de Mouros. Numa época em que o certame nortenho tinha cartazes cujo calibre permanece por igualar nos grandes festivais de Verão actuais, nesse dia os Melvins dividiram o palco com os Tomahawk e Public Enemy. Aliás, Mike Patton juntou-se aos Melvins na interpretação de “Black Stooges”, malha que encerrou uma actuação de cerca de quarenta minutos. Na altura, a digressão foi literalmente conjunta com os Tomahawk, com Dale Crover e David Scott Stone a manterem-se no palco, para o concerto da banda de Patton.

Quanto aos Melvins, a banda estava a promover o seu disco de 2022, “Hostile Ambient Takeover”. O 14º LP de estúdio da banda é mais um exercício que procura fundir alucinatórias mudanças de tempo, entre o punk e o prog, com ambientes de exploração sem regras, como no caso dos 15 minutos de “The Anti-Vermin Seed” e, claro, com demolidoras malhas com a afinação em Drop A como é exemplo “The Fool, The Meddling Idiot”. Este foi inclusivamente o tema que abriu o primeiro concerto de sempre dos Melvins em Portugal.

A actuação foi transmitida em directo pela SIC Radical e sobrevive nos canais de streaming. No player em baixo podem recordá-la integralmente. Eis a setlist completa: The Fool, the Meddling Idiot; Night Goat; Revolve; We All Love Judy; The Brain Center at Whipples; Let It All Be; The Bloat; The Bit; Black Stooges.

Leave a Reply