SWR Feast, A Sedosa Envolvência Gélida dos Mgła

Um encantamento tecido subtilmente, deixou os headbangers presentes em Barroselas enredados numa inquebrável teia nihilista, à mercê dos riffs melodicamente espartanos e das sumptuosas baterias dos Mgła. Mais um extraordinário concerto no SWR.

Comecemos por recorrer à oportuna descrição que o website oficial do SWR nos deixa sobre este projecto. «Quem diria que um projecto de estúdio, aparentemente sem grandes ambições, iniciado por Mikołaj “M.” Żentara, músico do underground polaco, se iria transformar numa das bandas de black metal mais populares e mais respeitadas do século XXI? Foi precisamente no início do século que teve início a existência dos Mgła e, apesar das tradições da sua Polónia natal no género, poucos poderiam antever o que aí vinha. Terá sido com o marcante “With Hearts Toward None” que se deu a viragem completa, a partir daí os Mgła começaram a dar concertos um pouco por todo o mundo, transformaram-se numa máquina letal também em palco e o resto, como se costuma dizer, é história».

Neste SWR Feast, regressaram a Portugal depois de mais dois concertos esgotados em 2019 em que deixaram o público nacional faminto por mais, e sob o palco de Barroselas fizeram descer uma escuridão espessa e envolvente como poucas até aqui. E isso sucedeu de forma sublime. A sua parede sónica nunca foi demolidora, nem assim pretende ser, mas foi tecendo uma teia aos poucos, até nos termos visto presos nela e sucessivamente enrolados por finos fios de seda. De repente, a meio do denso nevoeiro (se permitem o óbvio trocadilho com o significado do nome da banda na sua língua nativa), deparamo-nos imóveis, à espera do espigão venenoso, prostrados diante da essência da banda construída em torno do axiomático álbum de há dez anos atrás – ainda que, nos dez temas do alinhamento os dois mais recentes trabalhos, “Exercises In Futility” (2015) e “Age Of Excuse” (2019), tenham sido proeminentes.

No seu âmago, “With Hearts Toward None” é cerebralmente contido. As canções dependem de sulcos semelhantes e repetitivos e de um tema comum. No concerto, tal como nesse disco, os Mgła criaram uma experiência singular, despojando quase tudo menos a essência, substituindo os rendilhados supérfluos por uma performance matizada e uma dedicação inabalável. Ainda assim, global e fortemente melódica sem nunca perturbar o foco dos músicos, sem nunca chegar verdadeiramente ao shoegaze e abandonar a tradicional estética nihilista e crua do black metal. E embora qualquer discussão musical que comece e termine com “riffs” seja à partida subjectiva, em qualquer contexto, seria escamotear a realidade não referir quão forte é a capacidade dos Mgła na criação desses poderosos encantamentos auditivos. E se estes se revelaram, como a teia da aranha algo estáticos na sua forma, as baterias de Maciej Kowalski (aka Darkside) foram arrasadoras e memoráveis, preenchendo a quietude com dinamismo e despertando-nos a mente para o que, sem darmos por isso sucedera, tínhamo-nos perdido no nevoeiro.

No final de contas, fica a sensação de que, mesmo com reconhecidas condicionantes, o SWR Feast foi um digno prêmbulo do festival minhoto e considerando os Autopsy, Sijjin e Skeletal Remains, o concerto de Mgła foi mais um para entrar no debate de qual o melhor concerto. A setlist foi: Age of Excuse II; Exercises in Futility I; Exercises in Futility IV; Mdłości II; Age of Excuse V; With Hearts Toward None I; Age of Excuse IV; Exercises in Futility II; Exercises in Futility V; Age of Excuse VI.

Podem reviver o concerto em streaming no canal YouTube oficial do festival. As fotos são do Emanuel Ferreira.

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