Amor Vilão

O álbum de estreia homónimo de Amor Vilão é um trabalho discográfico singular no AOR luso. Uma gema escondida, com sofisticação nos arranjos e um protagonista improvável.

A certa altura, esse fenómeno teenager de audiências que foram os “Morangos Com Açúcar” tendeu para a música rock. O Sérgio Duarte (dos RCA), o André Indiana e até os Wraygunn iam surgindo como guia musical dos personagens. Até que “O Que Tens Na Alma?”, single do primeiro álbum dos Gota (disco homónimo de 2005), se tornou um dos temas mais rodados na série da TVI que imortalizou a boys band portuguesa D’ZRT.

Não é inocentemente que mencionamos os D’ZRT. Quando a banda anunciou um primeiro hiato, Cifrão decidiu criar um disco de música rock. Não sei se inspirado pelos Gota ou não, procurou a sua banda entre bares de música ao vivo da noite lisboeta, instrumentistas bem rodados e com currículo como hired guns. Malta como o Alexandre Leão ou o André C. Rodrigues. Ases instrumentais a acompanhar a prestação do Vítor Gonçalo Palminha Fonseca (Cifrão) que, vocalmente, não é exuberante, mas é apaixonada e suficientemente sólida para suportar momentos como essa quase a capella balada ao piano que é “Transparente, Indiferente”.

A primeira coisa que se repara no disco é a sua capa à Whitesnake. A sonoridade está longe da energia eléctrica e sexual do hard rock das lendas britânicas. “Amor Vilão” está mais numa fusão AOR com a desenvoltura orquestral das grandes obras de Andrew Lloyd Webber. Nos seus melhores momentos, por vezes algo vaudeville, os pianos e as guitarras são capazes de ser reminiscentes do sentido épico dos Queen, como está bem patente em “Luzes, Câmara, Acção”, por exemplo. Já o bluesy interlúdio/solo de guitarra “Branco Solidão” deve ser marcado em qualquer compêndio de shred português.

Em certa medida, esses arranjos (principalmente devido aos abusos com que estão destacados na mistura) acabam por tornar este trabalho menos orgânico como se pretenderia. Mas a intensidade da banda, as suas grandiosas progressões melódicas, a sofisticação dos orquestrações (obra do pianista Rui Ribeiro) e a competência da execução instrumental, revelam uma ambição pouco comum em projectos do rock português que chegam ao mainstream.

Infelizmente, a Sony não deu tempo a que este projecto maturasse e, depois desta estreia homónima de 2011, os fundos terão sido cortados para a produção de um segundo trabalho. Fica pelo menos um disco que, com as suas virtudes e os seus defeitos, tem muito a descobrir na sua preenchida tracklist, que é liderada pelo single “Desistir/Resistir”. Um conjunto de interlúdios e músicas que se debruçam honestamente sobre emoções como o amor, ódio, paixão, sede de poder, derrota e o renascimento emocional.

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