Holocausto Canibal, Crueza Ferina

“Crueza Ferina” é tudo aquilo que os portuenses sempre foram, mas com um groove incomparável com aquilo que fizeram até aqui. Vibrantemente dinâmico e sem compromissos diante de trends, é o melhor álbum dos Holocausto Canibal e um dos melhores do ano.

Este ano celebram-se duas décadas e meia da fundação dos Holocausto Canibal. Este ano de jubileu trouxe consigo o novo álbum, chegado no dia 27 de Maio via SELFMADEGOD RECORDS e Larvae Records (no lançamento internacional) e Xaninho Discos (Brasil). Neste momento, o grupo é um quarteto, contando com Z. Pedro, no baixo, António C. na guitarra, Diogo P. na bateria e Orca R. nos vocais. “Crueza Ferina” é o 6º álbum de estúdio da banda de Rio Tinto (Porto). É composto por 19 temas que foram gravados por João Ribeiro e que receberam masterização do guru Brad Boatright [Sunn O))), Obituary, Nails, Corrosion of Conformity].

Pela sua brutalidade sónica e pelo humor grotesco, há mais de duas décadas que os Holocausto Canibal reinam nas profundezas pútridas do underground e do grindcore nacional. Ao fim deste tempo, os álbuns da banda nunca são arautos de grandes surpresas, nunca comprometendo a sua ferocidade visceral em detrimento de trends. Todavia, a cada álbum da banda sente-se sempre um patamar acima dos anteriores. A razão para isto é simples. Se o ponto de partida, há vinte e cinco anos atrás, foi a violência e a mesma se mantém, sucede que o polimento das arestas se deu com a intransigência das rotinas – ensaios, composição, gravação, digressão – e a consequente “rodagem”. Cada vez mais maturada, com os músicos cada vez mais donos de fluidez na sua execução instrumental, a banda passou a ter aquele fluxo rock ‘n’ roll (sim, disparem “Campas do Negro Breu”, se persistem reticentes diante da afirmação). Significa que, há muito que aspectos técnicos mais toscos estão ausentes dos registos dos Holocausto Canibal e das suas apresentações em concerto (que, de resto, sempre ostentaram de forma mais exuberante este factor que referimos). Portanto, “Crueza Ferina” é tudo aquilo que os portuenses sempre foram, mas com um groove incomparável com aquilo que fizeram até aqui – mesmo admitindo que, apesar de contactar com a banda desde a sua concepção, o meu contacto com a sua discografia peque por epidérmico em alguns momentos.

“Exôdo Mortuoso”, o primeiro tema após a introdução que nos deixa os nervos em franja, conta com a participação de nome de sólida reputação no submundo do peso – Bob Vigna. O músico dos Immolation gravou o solo de guitarra nesta malha. E por falar em guitarras, desde este arranque fenomenal do disco, fica-se imediatamente com a sensação de “Crueza Ferina” ser, nesse aspecto particular, aquele que na discografia da banda apresenta melhor som, cheio de poder e articulação. Fenomenal trabalho de João Ribeiro. Enorme poder e equilíbrio na secção rítmica – sem excessos nos pratos – e uma intransigente parede de distorção, aliviada apenas em alguns momentos de fraseados melódicos, como “Psicótico Interlúdio”, que desencadeia de seguida a devastadora sequência de “Anátemas Nefandos”, “Esquartejado em Segundos”, a explosiva “Prenúncios Da Vingança Córnea”, com Diogo absolutamente demolidor nos blasts, e o aceno ao death metal old school de “Suprema Dominância Taurina”.

Vibrantemente dinâmico e consistente, o disco encerra com a jóia da coroa, “Quérolo dos Finados”, e o borderline d-beat de “Sortilégio da Perversão”. Uma palavra ainda para a beleza visceral da foto de Rui Pires que serve de capa ao disco, que é o melhor dos Holocausto e um dos melhores do ano. «Tem que se experimentar, se não se experimentar, não se sabe».

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