Jack White, Blunderbuss

Já com a marca de decano, “Blunderbuss” permanece como o melhor álbum a solo (foi o trabalho de estreia neste registo) de Jack White.

Quando se começou a falar neste disco e a antecipá-lo, a primeira grande questão seria o seu nível coesão. Não num sentido sonoro, pois Jack White tinha já os seus créditos perfeitamente firmados enquanto produtor, mas na própria musicalidade, isto devido ao gigantesco número de músicos que participaram no disco. Para reforçar esse aspecto, White recorreu aos comparsas de The Racounteurs como base, especialmente o baterista Patrick Keeler e ao baixista Jack Lawrence. Logo aí foi garantida a solidez na fusão que percorre o disco, entre o mundo da música popular norte-americana e um sentido vanguardista. Esse diálogo vai sendo feito entre nomes como Bryn Davies (contrabaixo e violoncelo) e Brooke Waggoner (órgão, Wurlitzer, Rhodes e pianos), estabelecidos e “bairristas” em Nashville, e Carla Azar, por exemplo, com uma carreira na bateria junto a nomes como PJ Harvey e John Parish. A intermediação, não podia ser de outra forma, cabe a Jack White. E “Blunderbuss” é um disco que pode ser tão aclamado em Nashville como em Manchester!

Como fait divers, não deixa de ser curioso a particular devoção que Jack White tem pela figura feminina e como se dedica a transformar mulheres em Deusas do Rock! Depois de Meg White, Alison Mosshart ou até mesmo a diva do country, Loretta Lyn. Agora, além das citadas Davies, Waggoner e Carla Azar, há ainda as prestações deslumbrantes de Olivia Jean na guitarra e o encanto vocal de Ruby Amanfu, auxiliada nos coros pela ex-mulher do músico, Karen Elson. Ao contrário de tanto disco de rock carregado de misoginia ou do blues torturado pela mulher demonizada, White torna a prostrar-se diante de um altar feminino!

Se já se sabia da capacidade de composição extravagante e extraordinária do músico, aqui a solo, mais do que sucedia em White Stripes ou em The Dead Weather, surgiu como um guitarrista de pleno direito. Ouvir os solos, com tiques de Frank Zappa, em “Weep Themselves to Sleep” e “I’m Shakin’” ou o riff com a força do rock clássico em “Sixteen Saltines”, provam White como um dos guitar heroes contemporâneos. A contemporaneidade, de facto, permanece a grande arma do músico. A forma como sabe utilizar estruturas clássicas e modernizar-lhes o som (“Take Me with You When You Go” é uma demonstração espetacular neste aspecto). E mesmo a forma como detalhes de produção actualizam um tema simples como “On and On and On”, os cellos com linhas suaves e elegantes coloridos com o processamento ao som de piano. E depois os acréscimos de slide guitar.

“Blunderbuss” é um daqueles discos raros em que é congregado o sentido de rádio sem beliscar a pertinência musical do álbum como um todo. Se na discografia anterior aquele sentido vanguardista do músico que assina este álbum era o foco, aqui é na capacidade como songwriter de White, na maturidade que adquiriu nessa tarefa. Portanto este é um álbum que vai muito além de ser excêntrico e termina como um disco simples de ser ouvido. As pontas dos extremos são dobradas até se tocarem pela acção de Jack White, com força genial.

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