«Foi feita à medida para mim – muito obrigado, Leo». Jeff Beck confessa a sua paixão pela Stratocaster e recorda os pioneiros anos da tecnologia em redor da guitarra eléctrica.
Nascido no dia 24 de Junho de 1944, Jeff Beck foi um dos melhores guitarristas e, ao mesmo tempo, um dos mais underrated de sempre. Guitarrista de técnica absolutamente singular, deslumbrou o mundo desde ainda antes da explosão do hard rock, há mais de meio século, até à sua morte no passado dia 10 de Janeiro de 2023. Desde o R&B dos The Yardbirds, ao Jeff Beck Group com Ronnie Wood e Rod Stewart, até à obra-prima de jazz/rock instrumental “Blow By Blow”, e um infindável número de aparições como músico convidado (Mick Jagger, Roger Waters, Brian May, Paul Rodgers, Stevie Wonder, Tina Turner, Jon Bon Jovi) e até uma ou outra incursão em blockbusters de Hollywood, Jeff Beck está constantemente a explorar e a fazer progredir a sua linguagem musical e a da guitarra eléctrica, mais especificamente da Stratocaster.
Precisamente, numa entrevista com Johnnie Walker, para o programa Sounds Of The ’70s, na Radio 2, poucos meses antes de morrer, o músico expressou genuína incredulidade pelo facto de a guitarra eléctrica ter chegado tão longe na cultura pop desde as suas origens rock ‘n’ roll dos anos 50. «Foi um rocket propulsionado desde ’54 até aos dias de hoje. Nunca pensei que a guitarra se sustivesse durante tanto tempo e que toda a gente no mundo soubesse o que é uma Stratocaster», refere Beck.
É tudo um ciclo, afinal. E da mesma forma que o Beck se inspirou em músicos como Les Paul, Buddy Holly, Scotty Moore e Cliff Gallup, despertou posteriormente a imaginação das gerações seguintes como um dos executantes mais expressivos de sempre a pegar numa guitarra – primeiro uma Telecaster, depois uma Les Paul e, por fim, a sua enorme paixão, a Strat. «Faz o que eu quero. É infinitamente variável no seu som e capacidades, com a ponte de molas. Foi feita à medida para mim – muito obrigado, Leo!»
Jeff Beck Stratocaster
Originalmente (muito antes de surgirem os modelos HSS), as guitarras possuiam os três pickups single coil com um comutador de 3 posições. Mas descobriu-se que, alterando o circuito entre a 1ª e 2ª posição, era possível utilizar o pickup da ponte e o do meio em simultâneo, o mesmo sucedendo entre a 2ª e 3ª posição – durante vários anos este tornou-se um truque amado por imensos guitarristas até que, em 1977, a Fender passou a produzir a guitarra com um switch de 5 posições. Este tipo de produção de fábrica pode ter retirado uma certa mística rock ‘n’ roll inerente à “alteração” apócrifa dos parâmetros originais, mas admita-se que trouxe muito maior estabilidade ao circuito.
Até aí, os 3 pickups eram completamente idênticos (as cores tonais derivavam simplesmente da sua posição na zona do corpo), mas a partir desta reformulação, em 1977 a Fender alterou também o pickup do meio – inverteu a fiagem e a polaridade, assim o magnetismo ficou como oposição ao magnetismo dos seus dois irmãos (a fiagem em torno da bobine conduz a electricidade nesse sentido oposto). O efeito prático desta decisão foi uma maior capacidade para anular o ruído eléctrico debitado pelos pickups, quando seleccionada uma posição intermédia (ponte+meio ou meio+braço). Este conceito, contudo, já era usado no sistema de humbuckers da Gibson e até no pickup split coil que a Fender desenvolvera para o Precision Bass. Actualmente todos os instrumentos Fender com single coils possuem um circuito deste tipo.

As Stratocasters originais possuíam, de fábrica, 5 molas a segurar a ponte ao corpo. Guitarristas como Jeff Beck removiam 2 dessas molas para permitir uma flutuação maior à ponte, permitindo utilizar a alavanca de vibrato para cima e para baixo de uma forma mais significativa – aliás, o estilo técnico de Jeff Beck tornou-se um baluarte deste tipo de execução. Beck namorou com Les Paul e Telecasters, mas foi com a Strat que sublimou o seu estilo. A forma pura como, sem usar palheta, faz soar a Strat é uma assinatura sonora única, potenciada pela sua mestria no controlo da alavanca de vibrato. O estilo de Beck exige provas constantes da versatilidade da Strat. Velocidade do braço, agressividade e presença nas distorções, suavidade dos single-coil, a resposta dinâmica do instrumento capaz de convergir dedilhados ou solos.
Naturalmente tem uma Stratocaster de assinatura. A Jeff Beck Stratocaster existe nas cores Olympic White e Surf Green. O corpo em alder possui acabamento em uretano. O braço de maple tem perfil “C”. A escala em tosewood; com raio de 9.5’’ e 25.5’’ de comprimento, com 22 trastes médio-jumbo. Largura do Nut: 1.6875’’. Pickups: 3 Dual-Coil Ceramic Noiseless com controlos Master Volume, Tone (braço), Tone (ponte/meio) e switch de 5 posições.
Hoje em dia é difícil imaginar que tenha havido um tempo sem distorção na guitarra. Beck foi um dos primeiros a adoptar o rock ‘n’ roll na cena do início dos anos 60 em Londres. Mas nada foi planeado. «Foi acidental. Tocámos em salas grandes eli nos anos ’64/’65 e o PA era inadequado, por isso subimos o volume ao máximo e descobrimos que o feedback seria a consequência. O Pete Townshend descobriu-o e usou-o em “My Generation” e depois comecei a usá-lo porque era controlável – podias tocar melodias com o feedback. Fiz isso uma vez, no Staines Town Hall, com The Yardbirds. E no fim a malta diz-me: ‘Sabes aquele barulho engraçado que não era suposto ouvir-se? Se fosse a ti, ia ver disso’. E eu disse: ‘Foi intencional – desapareçam’».
No player em baixo, podem ouvir a entrevista completa, na qual Beck também fala sobre trabalhar com David Bowie e ainda Stevie Wonder, em “Superstition”.
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