Lorde, Melodrama

“Melodrama”, o segundo álbum da neozelandesa, consagrou Lorde como uma das mais brilhantes arquitectas da pop contemporânea. Uma pérola de de beats estranhos e off notes.

O segundo álbum de  Lorde enfrentava a pesadíssima herança de “Pure Heroine” e do super single “Royals”. Na história da música não existem tantos artistas que, após um álbum de estreia tão impressionante, tenham conseguido criar um segundo álbum tão deslumbrante e imediatamente reformulado a sua sonoridade, desde logo, tornando-a mais upbeat. A neozelandesa prometia fazer-nos dançar, simplesmente, e conseguiu, naturalmente, apetece dizer!

Produzido por Lorde, Jack Antonoff e Frank Dukes, o álbum foi gravado entre o apartamento de Jack e os lendários Electric Lady Studios. Durante as sessões de composição, Lorde viajou entre os Estados Unidos e a Nova Zelândia diversas vezes. O processo durou cerca de dezoito meses. Ella Marija Lani Yelich-O’Connor abordou ainda a feitura de “Melodrama”: «Passei o dia em que foi editado a montar um puzzle no meu quarto de hotel em NY. Sentia-me esvaziada, não tinha ainda a noção de que fazer um disco te preenche e depois te esvazia… Para te preencher novamente».

O álbum é descrito pela autora descrito como uma trajectória durante uma festa em casa. «Numa festa há aquele momento onde aparece uma grande canção e ficas eufórica, e depois, mais tarde, vem aquele momento em que estás sozinha na casa de banho, a olhar para o espelho, e pensas que não estás com bom aspecto e começas a sentir-te horrível». Portanto, “Melodrama” fala sobre lidar com a solidão, com o desgosto de uma separação. O título remete-nos para as pungentes tragédias clássicas e, extravasando as hipérboles, aqueles seus cabelos de medusa dão a Lorde a solenidade de um oráculo. A forma como enche o espaço harmónico com a sua voz, ao mesmo tempo jovem e vetusta é a de uma deusa primaveril. Descontraída e tensa, alegre e triste, simples e complexa. Melodiosa e encantadora.

Comparando-o com “Pure Heroine”, este álbum parece mais estilizado, até por, segundo a própria Ella, tratar-se de uma «colecção de momentos, pensamentos e vinhetas», tudo uniformizado por Antonoff. “Melodrama” torna a pegar em assuntos banais da adolscência e alguns clichés rítmicos e melódicos da música pop, servindo-os, tal como em “Pure Heroine”, com uma autenticidade desarmante. Então, alternamos entre o mundano e o divino. Entre bairros urbanos e o éter nefelibata.

As estruturas das canções no álbum são tradicionais na sua progressão, com melodias feitas em torno do piano, em contraste com as influências hip hop do trabalho anterior. A cantora teve uma abordagem clássica, geralmente compondo a melodia e então tentando diferentes harmonizações. Por causa disso, todo o álbum pode ser tocado de forma acústica. Mas, enquanto são integrados novos utensílios instrumentais, a ultra dependência da sintetização possa ser apontada como a única falha do álbum, tal como no primeiro. Ao mesmo tempo, o uso dessa mesma sintetização é feito com mestria exótica e grande parte da música de “Melodrama” é composta por acidentes, off notes, criando os estranhos e cativantes balanços. Isso resulta num álbum de maior complexidade em detrimento do minimalismo que tanto marca “Pure Heroine”.

Ben Barter [bateria] e Jimmy Mac [sintetização] são os acólitos perfeitos para a voz da jovem Ella Marija e foram os músicos que gravaram os dois primeiros álbuns e, desde então, a acompanham em digressão. Parte de uma nova geração de bateristas, capazes de um trabalho conjugado entre acústico e electrónico mais consistente e criativo, Ben Barter, além da sua enorme versatilidade dinâmica, tem conseguido manifestar também criatividade até num sentido melódico dos arranjos.

Um pensamento sobre “Lorde, Melodrama

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