Para o bem e para o mal, Mike Mangini marcou uma era nos Dream Theater. Ao longo de cinco álbuns, Mangini criou um legado sólido com os monarcas do prog rock contemporâneo e se nunca foi consensual, também foi capaz de assinar o seu nome em alguns dos melhores momentos na discografia da banda.
No final de Outubro de 2023, os Dream Theater anunciaram o retorno de Mike Portnoy à sua formação, tornando a reunir-se com o guitarrista John Petrucci e com o baixista John Myung — com quem formou a banda em 1985 no Berklee College of Music — e com os membros de longa data James LaBrie e Jordan Rudess, vocalista e teclista, respectivamente.
Os Dream Theater, com a sua formação clássica restabelecida (ainda que Jordan Rudess não faça parte dos espetaculares álbuns da década de 90) têm planos de entrar em estúdio em breve e para começar a trabalhar naquele que será o seu 16.º LP de estúdio e o primeiro com Portnoy desde “Black Clouds & Silver Linings”, de 2009.
Com o baterista original a regressar à banda, Mike Mangini – que tocou com o grupo desde a saída de Mike Portnoy em 2010 – vai ser, obviamente, afastado, mas o músico diz perceber a decisão do grupo. «Eu entendo a decisão de trazerem o Mike Portnoy de volta neste momento. Desde o primeiro dia, a minha função não era preencher todos os papéis que o Mike tinha na banda. O meu papel era tocar bateria para ajudar a banda a continuar. O principal papel de manter a banda a funcionar ao vivo e com precisão todas as noites foi uma experiência intensa e muito gratificante», comentou Mangini.
Mangini juntara-se aos Dream Theater em finais de 2010, através de uma audição amplamente divulgada e na qual superou outros seis dos melhores bateristas do mundo: Marco Minnemann, Virgil Donati, Aquiles Priester, Thomas Lang, Peter Wildoer e Derek Roddy. Depois de ter criado a sua reputação na década de 90, quando tocou com os Extreme e, mais tarde, com Steve Vai, Mangini havia abraçado, a tempo inteiro, a carreira de professor no reputadíssimo Berklee College of Music.
Deixou essa posição para passar a tocar com os Dream Theater e sentou-se pela primeira vez a escrever com a banda no álbum homónimo de 2013, já depois de ter entrado para o lugar de Mike Portnoy para gravar “A Dramatic Turn Of Events”. Isto foi sempre motivo de enorme cisma. Para muitos fãs, a sua forma clínica de execução e com uma precisão cirúrgica a bater, tornam o som demasiado frio, desprovido de groove.
Ainda assim, com Mike Mangini atrás do drumkit, os Dream Theater criaram malhas de relevância e imponência superlativas nos álbuns “A Dramatic Turn of Events” (2011), “Dream Theater” (2013), “The Astonishing” (2016), “Distance over Time” (2019) e “A View from the Top of the World” (2021). Aliás, o tema “The Alien”, no último trabalho, valeu mesmo o primeiro Grammy de sempre ao grupo e é, precisamente, uma das dez malhas eleitas entre as mais marcantes da era Mike Mangini nos Dream Theater. Vamos por ordem cronológica…
“Breaking All Illusions” & Lost Not Forgotten (em “A Dramatic Turn of Events”) | Dois temas de duração épica. Na penúltima malha do álbum, a precisão rítmica de Mike Mangini é, de facto, maquinal e permite ao baterista transversar uma miríade de tempos e andamentos complexos, compostos e sincopados, sem grande esforço. O mesmo poderia ser dito sobre “Lost Not Forgotten”, malha repleta de viragens inesperadas. São dois dos maiores exemplos da renovação criativa que a banda teve nesta era e conseguem destacar-se mesmo considerando toda a discografia dos Dream Theater.
“Enigma Machine” & “Illumination Theory” (em “Dream Theater”) | “Enigma Machine” é um vigoroso tema completamente instrumental. Nele é notória a criatividade e o virtuosismo técnico de Mike Mangini. Em “Illumination Theory”, o grande protagonismo caberá aos teclados e orquestrações de Jordan Rudess, mas a solidez de Mangini no crescendo de intensidade, ao longo desta peça de paquidérmicos 22 minutos, é notável. O final mostra a banda num dos seus melhores momentos de sempre.
“The Gift of Music” (em “The Astonishing”) | “The Astonishing” é motivo de divisão, mesmo entre os fãs mais acérrimos dos Dream Theater. Mas se podemos dizer com margem de sgurança que este álbum conceptual está a milhas de “Metropolis Pt. 2: Scenes from a Memory”, também se pode afirmar categoricamente que “The Gift Of Music”, o primeiro single do álbum, é espetacular nos seus intensos contrastes dinâmicos e na forma como condensa toda a essência dos Dream Theater em apenas quatro minutos.
“At Wit’s End” & “Pale Blue Dot” (em “Distance over Time”) | O estrondoso épico que encerra o álbum de 2019 remete-nos para a sonoridade mais vetusta da banda, com os Dream Theater a soarem pesados no início, demonstrando proficiência técnica no meio e encerrando a malha de forma grandiosa. Antes da magnífica conclusão, este álbum contém um dos momentos de maior perfeição na fusão das guitarras de John Petrucci com as baterias de Mike Mangini, considerando todos os trabalhos que fizeram juntos. Além disso, “At Wit’s End” patenteia uma força emocional superlativa.
“The Alien”, “Sleeping Giant” & “A View from the Top of the World” (em “A View from the Top of the World”) | Vencer um Grammy já teve maior significado, mas uma banda de heavy metal consegui-lo (ainda para mais uma banda que exige algum “investimento auditivo”, digamos assim), é um feito de relevância extraordinária. Desde os drum fills de Mike Mangini, na abertura, “The Alien” – na exploração musical que os Dream Theater fazem da possibilidade de vida extra-terrestre – é um tema, precisamente, extraordinário e nem sequer é o momento mais fulgurante do álbum.
Os épicos “Sleeping Giant” e o tema homónimo são o centro nuclear do último LP de Mangini com os Dream Theater. Duas imensas e meticulosas teias musicais, pródigas em arranjos grandiosos, impacto melódico e criatividade cativante.