O importante álbum homónimo, o décimo segundo álbum de estúdio e o primeiro disco que os Dream Theater escreveram com Mike Mangini, que já gravara o anterior.
Ainda que alguns fanáticos possam “ir aos arames”, os Dream Theater têm perdido a capacidade de entusiasmar para lá da exibição das suas capacidades técnicas de execução. E nem o facto de uma das mudanças de baterista mais mediáticas de sempre valeu grandes mudanças. Após uma longa novela Mike Mangini sentou-se pela primeira vez a escrever com os Dream Theater neste álbum, depois de ter entrado para o lugar de Mike Portnoy para gravar “A Dramatic Turn Of Events”. Mangini juntou-se ao Dream Theater em finais de 2010, através de uma audição amplamente divulgada e na qual superou outros seis dos melhores bateristas do mundo: Marco Minnemann, Virgil Donati, Aquiles Priester, Thomas Lang, Peter Wildoer e Derek Roddy. Depois de ter criado a sua reputação na década de 90, quando tocou com os Extreme e, mais tarde, com Steve Vai, Mangini havia abraçado, a tempo inteiro, a carreira de professor no reputadíssimo Berklee College of Music. Deixou essa posição para passar a tocar com os Dream Theater.
Isto foi motivo de enorme cisma. Para muitos fãs, a sua forma clínica de execução e com uma precisão cirúrgica a bater, tornam o som demasiado frio, desprovido de groove. Citando livremente um amigo baterista, o Mangini tecnicamente é melhor do que o Portnoy, mas executa como um músico contratado que tem que cumprir a sua função e não deixa o seu cunho nem alma nas batidas. As batidas são monótonas, sem vida, sem dinâmica. Soa sempre com o mesmo volume e intensidade, soa artificial e demasiado mecânico.
Já em 2021, numa entrevista no “The Everyman Podcast”, Mike Mangini abordou o facto de ainda não ter sido aceite por um amplo número de fãs, que se mantém agarrados aos dias em que Mike Portnoy ainda estava na banda e que ainda avaliam cada segundo dos Dream Theater sob essa lente. «Estamos [Dream Theater] sob um escrutínio tal que chega a ser quase hilariante. Não importa há quanto tempo [estou na banda] – há um pequeno grupo de fãs para os quais simplesmente, não importa o quê, não há nada que possa fazer bem. Não há qualquer problema – as pessoas estão habituadas àquilo a que estão habituadas e tudo isso. Isso simplesmente não me incomoda. Compreendo isso. Mas essa malta… Todos os primeiros comentários que surgem estão a bater-nos e é toda essa malta. (…) Estão sempre à espera de cada coisa nossa, apesar de já não gostarem de nós. Acho isso bizarro». O baterista aprofunda mais a questão da ligação emocional dos ouvintes a certos discos ou momentos das bandas. «Tudo o que sei é que essas pessoas aparecem sempre e permanecem. Por isso, pergunto-me porquê. Mas talvez seja, mais uma vez, uma coisa de nostalgia: ‘Ei, sou um fã de AC/DC. Não quero mesmo que se afastem muito do ‘Back In Black’. Não quero’. Cada banda teve um par de álbuns, uma era ou o que quer que seja, que certas pessoas gostam mesmo. E quando isso muda, é desconfortável. A questão é a seguinte, o essencial de tudo isto: compreendo isso. Eu disse-o desde o primeiro dia: Não vou ser apreciado por certa percentagem de pessoas. E também não teria gostado de mim. Portanto, siga», confessa, descontraído.
Mais que a troca de nomes na bateria, a noção de que a alquimia estaria a perder-se conduziu a uma maior auto-reclusão na construção deste décimo segundo registo de estúdio. Dar ao álbum o nome da banda e ter John Petrucci a assumir exclusivamente a produção terá sido vontade de fazer reencontrar os Dream Theater com a sua essência. Há, neste álbum, um maior esforço de busca melódica. A abertura e “The Enemy Inside” a roçar-se em coisas do power metal sinfónico, “The Looking Glass” ou “The Bigger Picture” com aquele cheirinho AOR que alguns dos melhores momentos da carreira da banda carregam, são prova daquela ideia. O deslumbre pelos complexos desafios matemáticos (o instrumental “Enigma Machine”) está com um ar mais rocker. Mas em tudo isto, a banda consegue surpreender pouco. Diga-se, no entanto, que quando consegue, vale plenamente a pena.
Como sucede, por exemplo, em “Behind The Veil” – quando esperamos uma daquelas baladinhas, somos brutalizados por um riff bem Megadeth. Pena que tais momentos acabem por durar pouco. Admita-se que já não se pode considerar defeito, mas feitio… É também neste tema que temos um dos melhores solos de Petrucci desde, provavelmente, o álbum “Awake”. Boa dinâmica, construção envolvida com os instrumentos em torno, final para a bridge simplesmente espectacular. Depois surge uma abertura épica em “Surrender To Reason”, mas é incompreensível como a banda opta por quebrar um tema que poderia ser o melhor do disco com aqueles interlúdios acústicos tão tradicionais quanto enfadonhos. Já “Along For the Ride” é completamente desnecessária.
É no final, com a gigante “Illumination Theory”, que o disco passa a valer a pena. Grande malha! Se viesse acompanhada apenas da abertura do disco, “The Enemy Inside” e, admita-se, por “Behind The Veil” e o tema instrumental, teríamos um dos melhores álbuns dos Dream Theater. Assim, “Dream Theater” é apenas o décimo segundo álbum da banda.
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