O “álbum final” dos Pink Floyd. Uma homenagem de David Gilmour e Nick Mason a Richard Wright.
É bem difícil falar sobre um disco de Pink Floyd, porque para toda a gente, exceptuando uns poucos haters, um álbum das lendas britânicas é sempre um “acontecimento” e os loucos números de vendas deste álbum, nesta era, provam-no. É ainda mais difícil falar sobre um disco como “The Endless River” devido ao seu enorme valor sentimental e ao que representa no universo musical. O “último álbum” dos Pink Floyd é uma homenagem a Rick Wright. Portanto, há uma maior preocupação em ter tido o falecido músico presente e as estruturas dos temas parecem apenas suficientemente desenvolvidas para justificar a edição dos outtakes.
Aliás, em Julho de 2014, a banda confirmava a edição de “The Endless River” no seu website e, ao mesmo tempo refreava as expectativas em torno do disco: «Os Pink Floyd confirmam que irão editar um novo álbum, “The Endless River”, em Outubro de 2014. É um álbum principalmente de música ambiente e instrumental baseado nas sessões de gravação do álbum “Division Bell” em 1993/1994, onde participaram David Gilmour, Nick Mason e Richard Wright. Este álbum é produzido por David Gilmour com Phil Manzanera, Youth e o engenheiro de som é Andy Jackson».
Ainda assim, tudo somado, talvez deva dizer-se que “The Endless River” é um álbum que cedeu aos interesses da indústria. Estes outtakes caberiam bastante bem numa reedição de “The Division Bell” e teriam uma maior eficácia nesse contexto, em vez de terem sido expostas na forma frágil em que acabaram editadas.
Paradoxalmente, os temas, até pelo predominante cariz instrumental do disco, acabam por soar mais ao experimentalismo de improvisação que é marca dos primeiros álbuns da banda, mas sem a mesma densidade sonora. Outras fases da banda vão sendo ecoadas (principalmente, e naturalmente, da era Gilmour), como que em reflexão cronológica – como é exemplo a cavalgada de delays de “Allons-y 2”, o “Run Like Hell” deste álbum.
“A Momentary Lapse Of Reason” foi o álbum de revolta de David Gilmour, e “The Division Bell”, o verdadeiro canto do cisne da banda. “The Endless River” recupera o som único do guitarrista. Mas se este ainda consegue manter a sua tremenda eloquência musical e a beleza sonora dos Pink Floyd, a escala grandiosa que fez a reputação da banda está mais esbatida e o álbum não se consegue despir do aburguesamento, merecido diga-se, de Gilmour.
Não deixa de ser um gesto bonito, homenagear Wright. E, de facto, momentos solo como “Autumn ’68”, com Wright aos comandos de um poderoso órgão de tubos, ou a fantasia de “Calling”, não mereciam ficar trancados numa gaveta. No final, “The Endless River”, não sendo exuberante, é charmoso e bonito. E ainda nos deu a deslumbrante “Louder Than Words”, uma das melhores canções da fase Gilmour. A primeira canção “real” desde 1994 é a única canção vocalizada (exceptuando alguns poucos coros ao longo do disco), cuja letra foi escrita pela esposa de David Gilmour, Polly Samson. O tema segue os ambientes de “Division Bell”. Numa cadência lenta, com alguns coros gospel, sintetizações grandes e os solos inigualáveis do guitarrista.
No final, o álbum sente-se como uma homenagem singela e sentida de Mason e Gilmour ao seu amigo e não se confirmaram os maiores receios que, de resto, surgiram em força mal se conheceu a capa. Um homem (presumivelmente Wright), de camisa branca esvoaçante, rema a um pôr ou nascer do sol, sobre um mar nuvens. Horrorizados, fãs e críticos questionavam esta imagética new age e onde teria ido parar o tradicionalmente genial design dos discos anteriores. “The Endless River” não envergonha a colossal reputação dos Pink Floyd, mas também não a engrandece.
Um pensamento sobre “Pink Floyd, The Endless River”