Os Primeiros Álbuns de Van Halen, A Frankenstrat, a Bumblebee & a Shark

Os dois primeiros álbuns (principalmente o de estreia) dos Van Halen, a técnica de Eddie, as guitarras que construiu e o som da banda, mudaram para sempre o som do hard rock e da história guitarra eléctrica.

Break de bateria, acorde aberto em Lá bemol, e um puto com 22 anos começava a rasgar a guitarra. Através de um Marshall 1959 Super Lead [de 1968], com o sinal processado por um MXR Phase 90, um Univox EC-80 e um Echoplex, e com uma guitarra “monstruosa”, a Frankenstrat, dava-se a erupção de um vulcão de shred, feito famoso pelo tapping com duas mãos, que acabaria em Mi bemol. “Eruption” é o testemunho de Eddie Van Halen a fundir o melhor de dois mundos, com base no clássico rock ‘n’ roll “Let Me Swim”, dos Cactus, e na peça erudita “Etude No.2”, de Rodolphe Kreutzer, como inspiração. O mundo da guitarra acabara de mudar.

Gravado em 1977, a abertura do primeiro álbum homónimo de Van Halen metia-nos a “correr com o Diabo” em 1978, quando foi editado. Um dos melhores álbuns de rock da história, em plenos termos musicais – nas canções e no instrumental, nas inovações que trouxe – dava a conhecer um guitarrista que hoje só pode ser ensombrado por Jimi Hendrix, evocando a analogia futebolística da discussão entre Pelé e Maradona. Ao contrário do que possa ser pensado o álbum é assente em estruturas simples e bem definidas. Aquele groove staccato herdado dos AC/DC, promovido pelo baterista Alex Van Halen e pelo baixista Michael Anthony; com a guitarra de Eddie Van Halen a pisar caminhos abertos por Eric Clapton com os Cream e a lançar pontes para o glam de David Lee Roth e para o que seria uma grande fatia da sonoridade rock durante toda a década de 80 e mesmo inícios dos anos 90.

A EVH Gear relembra: «Quando o fogoso álbum de estreia dos Van Halen surgiu, nunca ninguém tinha ouvido uma guitarra como a tocada por Eddie Van Halen. Porque nenhuma existia. Que guitarra era? Não era possível comprar nenhuma. Porque tinha sido o próprio Eddie a construí-la».

FRANKENSTRAT

«Nenhuma guitarra produzida em série possuía as características que ele precisava para catapultar o seu estilo de tocar. Eddie sabia-o bem, tendo experimentado alguns modelos tradicionais durante os seus primeiros anos como guitarrista e tendo considerado que todos deixavam a desejar de uma ou outra forma. Foi por isso que tratou pessoalmente da questão». Partindo da sua ’58 Fender Strat, Eddie decidiu que precisava de uma peça de madeira mais pesada para o corpo, por isso comprou um corpo com a forma Strat por 50 dólares e um braço por 80». Naturalmente, o novo corpo tinha as rotas de ligação pré-fabricadas para três pickups single-coil, a “Frankenstrat” era composta por um corpo Strat, curiosamente da Charvel, em ash a acolher um circuito eléctrico Gibson ES-335 no humbucker da ponte (que mais tarde seria substituído por um Seymour Duncan), com braço e escala em maple. Também optou por remover o verniz do braço, mais fino e largo que os tradicionais, e retrastejou-o com fio de trastes maior usando cianoacrilato (vulgo Super Cola). Para deduzir o feedback envolveu o pickup em cera de parafina e para compensar a distância para o circuito single coil original encaixou-o enviesado.

Foi para desenvolver a “Frankenstrat” que Eddie se juntou a Floyd Rose e desenvolveram a ponte de vibrato e micro afinação mais emblemática do universo da guitarra. Recortou e instalou o seu próprio pickguard preto, feito artesanalmente, cobrindo as ligações dos pickups do meio e do braço e instalou um único botão controlador de volume (ainda que o botão seja célebre por ser um botão de “Tone”), nut em latão e a tailpiece da sua ’58 Stratocaster. Foi o corpo a receber primeiro o acabamento às tiras que se tornaria icónico só por si; Eddie pintou-a a preto e branco com laca acrílica Schwinn, usada como tinta para bicicletas. A guitarra não demorou muito tempo a construir e todo o processo não ultrapassou sequer os 150 dólares, todavia iria mudar o mundo da guitarra eléctrica para sempre, tal como a técnica de Eddie Van Halen o fez.

RÉPLICAS

A “Frankenstrat” foi alvo de várias réplicas. Primeiro a da própria Charvel, de listas pretas e amarelas, que Eddie usou em “Van Halen II” (a Bumblebee que já abordaremos). Depois foi a Kramer em 1983, e Eddie passaria a usar um braço da marca na guitarra, usada na tour de “1984” até à de “OU812”; também houve o modelo “Shark”, construído a partir de uma Ibanez Destroyer, cuja madeira foi serrada para parecer-se com as mandíbulas de um tubarão – infelizmente isso também provocou a degradação do som do instrumento, que agora está retirado de actividade após ter sido usado nos vídeos de “Runnin’ With The Devil” e “You Really Got Me”.

Mais recentemente a Charvel, através do grupo Fender, tornou a fazer uma edição limitada a 300 cópias, a Charvel EVH Art Series Guitar. Em 2018, para celebrar o 40º aniversário da guitarra, foi o próprio Eddie Van Halen, com a sua marca EVH Gear, a reproduzir a guitarra através de três edições ultra limitadas. As guitarras Super ’78, ’78 Eruption Relic e ’78 Eruption. Na capa do álbum de estreia de Van Halen, editado em 1978, Eddie Van Halen aponta o seu instrumento às tiras pretas e brancas à câmara, como se estivesse a ser profético. Afinal, essa é a guitarra que Eddie usou no espantoso e sem precedentes instrumental “Eruption” (daí o nome destes modelos) tornando, quase imediatamente, esse instrumento num ícone intemporal, simbólico de uma mudança de paradigma no universo da guitarra eléctrica e do rock ‘n’ roll.

Pela primeira vez, a EVH Gear recriou oficialmente este “bacalhau”, que vem acompanhado de um estojo cronologicamente correcto e com vários extras a acompanhar a guitarra. Nas palavras de Eddie Van Halen: «De todas as guitarras que construí, a preta e branca será sempre a minha favorita, pois fez tudo o que precisava que uma guitarra fizesse e que antes dessa guitarra não existia. Tanta coisa mudou por sua causa. Foi com ela que gravei o primeiro álbum e fiz a primeira digressão mundial. A ’78 Eruption é tão próxima da original, no som e sentimento, quanto humanamente possível. Estou extremamente orgulhoso». Apresentamos as características principais dos três modelos.

Limitada a oito exclusivos modelos, a Super ’78 (na imagem de entrada do artigo) possui todas as especificações da guitarra original de “Eruption”, incluindo um corpo Strat em ash, braço bolt-on em maple com acabamento em óleo, escala em maple com o raio escorreito de 12”, com os dots em katalox e os 21 trastes jumbo descaídos, tal como o pickguard recortado manualmente. O pickup é um humbucker EVH Frankenstein na ponte vintage Fender Stratocaster. No hardware destaca-se ainda o bloqueador de ponte em latão da Kluson e os afinadores Schaller. O acabamento branco com tiras pretas foi desgastado para imitar o uso da guitarra após a sua primeira digressão mundial. Para homenagear essa época, a EVH recriou o estojo original da G&G que Eddie usava (também com tratamento de desgaste da tour) e encheu-o com vários acessórios da década de 70 que o guitarrista carregava, como Fender Super Bullets, palhetas tortoiseshell picks, a correia corrente e a lata de óleo 3-in-One. Além disso, há um booklet de coleccionador exclusivo, o passe de backstage e vários artigos autografados, entre os quais o certificado de autenticidade, uma foto em concerto de Eddie Van Halen, o vinil de “Van Halen” e um raríssimo vinil vermelho original de “Looney Tunes Merrie Melodies”, dos Van Halen. Para acrescentar valor coleccionável a todo o “pacote”, Eddie Van Halen tocou “Eruption” em cada uma das guitarras e autografou a face posterior do headstock – tudo filmado num vídeo para a posteridade que será revelado aos compradores.

Limitada a 30 unidades, a ’78 Eruption Relic também foi recriada ao milímetro a partir do modelo original e possui todas as suas características: corpo Strat em ash, braço bolt-on em maple com acabamento em óleo, escala em maple com o raio escorreito de 12”, com os dots em katalox e os 21 trastes jumbo descaídos, tal como o pickguard recortado manualmente. Pickups e hardware também são iguais ao modelo Super ’78. Também o estojo G&G recebeu o mesmo tratamento relic e possui os mesmos acessórios e artigos, com excepção da cópia original do vinil “Looney Tunes Merrie Melodies”, dos Van Halen. Estes modelos também não foram tocados por Eddie Van Halen antes de serem embalados.

Esta versão limitada a 40 unidades, a ’78 Eruption é uma réplica da condição em que a guitarra original se encontrava antes de ser iniciada a primeira digressão dos Van Halen. Sem o tratamento relic, partilha as especificações dos dois modelos anteriores. O estojo G&G é igual ao que acompanha os modelos Super ’78 e ’78 Eruption Relic, mas também se apresenta sem o tratamento para simular o desgaste da tour. Possui os mesmo acessórios (Super Bullets, palhetas, etc) e artigos do modelo ’78 Eruption Relic.

BUMBLEBEE ’79

Em 2019 celebraram-se os 40 anos do segundo álbum da banda dos irmãos Van Halen e a EVH Gear tornou a recriar a guitarra que Eddie Van Halen usou nesse disco. Editado em 1979, “Van Halen II” foi cinco vezes platinado. A liderar o seu som estava uma guitarra que Eddie estreou, preta com tiras amarelas, e ficou estampada na capa do álbum. Limitadas a 50 réplicas para todo o mundo, o modelo de homenagem à ’79 Bumblebee possui todas as características da guitarra original, incluindo corpo Strat em ash, braço bolt-on birdseye maple com acabamento em óleo, escala 12″ em maple com 22 trastes jumbo, marcações katalox e Strat-style “Tone” volume knob. O pickup, colocado na ponte, é um humbucker EVH ’79 Bumblebee. Também estão replicados os seis buracos de aparafusamento (ocultados debaixo do protótipo original da ponte locking tremolo e recriados especialmente neste projecto), além do locking nut da guitarra original.

A pintura original, que na verdade é metade do appeal, está reproduzida, mas com tratamento para simular o desgaste que sofreu através de intensa digressão em 1979. O hardware é cromado. No headstock encontra-se a assinatura de Eddie Van Halen, para acrescentar valor a cada uma destas 50 peças de colecção. Custom-made Anvil hardshell case, cordas ’70s-era Fender Super Bullets, palhetas tortoiseshell Van Halen ’70s, booklet exclusivo da Bumblebee, livro Young Guitar Van Halen Live Tour in Japan 1978 & 1979 e vários artigos autografados, além de certificado de autenticidade, foto de concerto 8″x10″ de Eddie Van Halen em 1979 e uma cópia em vinil do álbum “Van Halen II”, acrescentam ainda mais valor à guitarra.

Durante o processo de gravação de “Van Halen II”, Eddie Van Halen procurou renovar o seu som, em vez de tornar a usar a “Frankenstrat” original que estava a ser imensamente copiada por várias marcas de guitarras. Eddie teve a ideia de construir uma nova guitarra com corpo ash e alterar as cores da pintura listada, com a electrónica instalada na face posterior da guitarra não haveria necessidade de um pickguard. Encarregou Wayne Charvel do recorte do corpo e o braço em maple foi construído por Lynn Ellsworth da Boogie Bodies. Outras características da primeira vida da guitarra eram um nut normal, um pickup humbucker Mighty Mite com bobines transparentes, o singular botão de volume e uma ponte tremolo com o design original Charvel six-screw brass, além dos afinadores Schaller.

O visual era do perfeito agrado do guitarrista, mas o som nem por isso e Eddie passou imediatamente a fazer pequenos ajustes à guitarra. Instalou um novo braço maple da Boogie Bodies, sem acabamento, e uma escala maple com raio de 12”. Depois mudou trocou o pickup, instalando um clássico DiMarzio Super Distortion, mas trocou-lhe o íman cerâmico por um alnico 2, extraído de um Gibson PAF. Desfiou o pickup, mergulhou-o em cera parafina e reforçou os cabos com cobre, e tornou a enrolá-lo.

Eddie Van Halen também removeu a ponte original da Charvel, deixando a marca dos seis aparafusamentos anteriores. Entretanto instalou um protótipo de um Floyd Rose de dois pontos de fixação e tornou-se o primeiro guitarrista conhecido na história do rock a usar um sistema tremolo com locking-nut. Trocou ainda, e agora já estamos no limiar do maníaco, o botão de volume cromado pelo Strat-style skirted “tone” knob. Após todas estas modificações, apenas o corpo original, a pintura, os afinadores Schaller e os strap hooks permaneceram, da primeira versão da guitarra.

A “Bumblebee”, como rapidamente passou a ser conhecida pelos fãs, tornou-se extremamente popular e permanece como uma das guitarras favoritas dos fãs. O modelo original, como sucedia aos tesouros dos faraós, num sinal de enorme respeito, foi enterrada ao lado da lenda dos Pantera, o guitarrista “Dimebag” Darrell Abbott, que morreu de forma trágica em 2004. Eddie Van Halen era a principal influência do tufão texano e a Bumblebee era a sua guitarra favorita.

STRIPED SHARK

Ainda em 2019, a EVH estreou a Striped Series Shark, uma guitarra inspirada no modelo que Eddie Van Halen usou durante a primeira digressão mundial dos Van Halen, em 1978. Com o seu espírito “engenhocas”, Eddie Van Halen pegou no design angular offset da guitarra e serrou um pedaço do corpo, deixando arestas dentadas irregulares na madeira. Após aplicar uma camada de pintura prateada, o guitarrista acrescentou o seu icónico padrão listado e terminou o rude acabamento usando tinta de bicicleta. O resultado final tornou-se famoso e aclamado pelos fãs e foi imortalizado no vídeo de “Runnin’ With The Devil” e na fotografia da frente e verso de capa do álbum “Women And Children First”, de 1980. Desde então, passou a ser um objecto de culto para guitarristas e fãs do músico.

A nova EVH Striped Series Shark em acabamento Burgundy com Silver Stripes possui um angulado corpo em ash emparelhado com um braço fixo em maple. O braço em si apresenta um perfil “C” modificado, com a cabeça no formato de taco de hóquei e com o mesmo acabamento que o corpo. O braço rapidíssimo possui uma escala pau ferro com raio composto 12”-16”, 22 trastes jumbo e pintas vbrancas como marcadores. O “Tubarão” está equipado com unidades humbucker custom EVH Wolfgang® alnico 2 na ponte e no braço, carregados de sustain e espessura e uma equilibrada curva de equalização. Tal como no modelo original, o pickup da ponte possui bobines em cor pergaminho e fiagem em entrançado de metal, o pickup do braço possui bobines pretas.

O potenciómetro de volume é de baixa fricção e possui treble bleed, para reter frequências agudas mesmo em volume atenuados. Uma ponte cromada em solid-brass harmonica oferece ataque, presença e sustain. Destacar ainda specs como o switch de três posições, o nut em latão, afinadores Gotoh com a estampagem cromada e dourada EVH e os ganchos com tensores no corpo. Mais info e specs em evhgear.com.

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