Os Amenra lideram uma vaga de confirmações que incluem nomes como os Ken Mode, Celeste e Big | Brave. São dezoito nomes anunciados para se juntarem aos SUNN O))) no Amplifest 2023.
Na sequência daquela que foi a sua edição mais ambiciosa de sempre, este ano o Amplifest voltará a fazer do Hard Club, no Porto, o ponto de encontro para melómanos de todo o mundo. O festival que, desde um longínquo 2011, se tem afirmado como uma experiência de descoberta dos espaços mais negros e transgressores da música de peso contemporânea realiza-se nos dias 23 e 24 de Setembro, no Hard Club, Porto, e a Amplificasom começou por revelar logo uma das atracções principais, com um muito aguardado regresso dos norte-americanos SUNN O))) ao nosso país.
Hoje, quarta-feira 17 de Maio, o cartaz recebeu a confirmação de mais 18 nomes num fim de semana que promete muito. De todos, começamos por destacar logo os belgas Amenra, que têm um considerável following por cá e materializam finalmente um regresso a um evento em que já foram muito felizes. No entanto, há muito mais para celebrar, com o retorno de um sempre intenso David Eugene Edwards ou dos demolidores Celeste e Ken Mode, a que se juntam também os Big | Brave, Esben & The Witch, Hexvessel, Mutoid Man, Sir Richard Bishop ou os nacionais Hetta e NECRØ, entre muitos outros.
Além disso, o festival abre, pela primeira vez, em Serralves com a apresentação de FROM RUIN, uma colaboração entre Rui Chafes e os Candura. O evento que pretende ser um espaço de encontro em torno da música e das suas áreas de contacto integrará ainda a primeira exibição no Porto de Even Hell has its Heroes, de Clyde Petersen, um retrato poético do universo musical dos Earth e da vida dos seus fundadores. A sessão será de acesso livre (mediante levantamento de bilhete no dia) e terá lugar no domingo, dia 25 de setembro, pelas 11h00 no Batalha – Centro de Cinema. O acesso a esta atividade é livre, mas implicará reserva de bilhete em amplificasom.seetickets.com
Podes conferir todos os nomes confirmados em baixo. Um cartaz onde se misturam estreias nacionais e europeias, regressos e descobertas para novos nomes da música pesada nacional e internacional. O alinhamento diário e horários serão anunciados mais à frente.
Arriscando o perfil de alguns dos nomes do cartaz, começamos pelo projecto de João Vairinhos e Sara Inglês. O universo sonoro de NECRØ poderia ser descrito como uma espécie de casamento entre uns Boy Harsher mais tétricos e um Perturbator mais exploratório, mas a verdade é que os atributos composicionais e vocais aqui apresentados têm, na sua génese, uma personalidade que dispensa qualquer exercício metafórico comparativo, por muito criativo que possa parecer. Sara Inglês tem um timbre gélido e, ainda assim, sensual, o que lhe confere uma singularidade assinalável e um atributo que só a ela lhe reconhecemos. Este aparente paradoxo, de uma voz espectral que simultaneamente nos ensombra e nos aconchega, assenta que nem uma luva nas sorumbáticas estruturas rítmicas e melódicas que imergem no sórdido território de sons urdidos por João Vairinhos.
Na sua apresentação dos Big | Brave, aquando da sua estreia no nosso país, em 2002, a Amplificasom dizia-nos que o trio canadiano é mestre numa arte só sua – na qual a estatuária dos poderosos monólitos de ruído e drone, cinzelados pela força de um incomplacente dueto de guitarras e pela percussão primal, mas calculada e rigorosa, se entrelaça com uma delicada filigrana delineada pela espectral voz de Robin Wattie. A muito aguardada estreia em Portugal dos Big | Brave terá como mote principal a apresentação do mais recente e muito aclamado álbum “Vital”, o quarto sob a asa da label de culto Southern Lord – gerida e curada por Greg Anderson, uma das figuras dos incontornáveis Sunn O))) e com quem já colaboraram. Para além de reflexões sobre a condição humana, “Vital” mostra ainda os Big‡Brave a abordarem algumas das questões sociais mais prementes nos dias de hoje, tais como as injustiças raciais e de género.
Dizer que as rosas também possuem espinhos é um dos lugares mais comuns que existem e usar isso como analogia à voz de Rachel Davies também não será, propriamente, revolucionário. Mas a intensidade tão doce quanto áspera de Esben And The Witch, também não desabrochou do nada. Com o álbum “A New Nature” (em 2014), o trio mudou muitas coisas. O que não mudou foi o muito de uma estranha atmosfera gótica que não é, exactamente, gótica, herdada de PJ Harvey. Uma melancolia bucólica rasgada pelo urbanismo punk que a colaboração com um guru como Steve Albini fez surgir. Os Esben & The Witch, que não lançavam música nova desde o muito aplaudido “Nowhere”, de 2018, editam o seu sexto álbum, intitulado “Hold Sacred”, em Maio de 2023. Segundo comunicado de imprensa, o trio britânico começou a desenvolver esboços grosseiros das músicas que aparecem no novo longa-duração numa casa rural nos arredores de Roma ainda em 2019. As sessões passaram ainda pelas paisagens marítimas em redor da Invicta cidade do Porto e em zonas rurais de França e Alemanha. A banda assim o refere no Bandcamp oficial dedicado a “Hold Sacred”.
Os Amenra fazem parte de um muito restrito grupo de criadores: aqueles cuja arte é genuinamente transcendente, capaz de nos transportar a um lugar que até ali desconhecíamos — especialmente quando a experienciamos durante uma das suas actuações, onde a sua música, forjada a partir das mais lancinantes extremidades do sludge e do doom, atinge um patamar extra-humano. Para este reencontro os belgas trazem consigo “De Doorn”. É o primeiro disco da banda na Relapse Records e, de certa forma, quebra algumas correntes com a sequência dos álbuns “Mass”. A determinação de introspectivamente olhar abismos e abrir espaço catártico permanece tão espartana como sempre, ainda que a evocação de hórrido desespero se sinta menos teatral.
Formados em 1998, pelas mãos de Stephen O’Malley e Greg Anderson, os SUNN O))) têm vindo a revolucionar a forma como pensamos a música, construindo um corpo de trabalho que forja novas conexões entre os mundos do metal, drone, jazz, minimalismo e composição contemporânea. Nas suas edições de estúdio, exploram práticas composicionais complexas sem, com isso, abandonar a estética visual do metal, escavando e expandindo o próprio género – algo ainda mais evidente em colaborações com figuras como Scott Walker, Pan Sonic, Earth, Ulver ou Boris.
O sentido experimental dos SUNN O))) ultrapassa largamente o espectro negativo tantas vezes associado ao que se chama de sonoridades extremas. A força física do som da banda possui um sentido xamânico e, no final, catártico. A potência extrema dos amps une a assimetria entre mundo sensível e mundo inteligível, racionalismo e misticismo. Surpreende o metodismo com que, inspirados no imenso poder dos amps que homenageiam, a banda constrói mantras valvulados. Tivemos a oportunidade de desvendar um pouco desse universo onde o mecânico e o espiritual se tocam, na última vez que Stephen O’Malley esteve em Lisboa. No seu 10º aniversário, em 2016, o MusicBox recebeu uma espécie de “lado B” dos Sunn o))). Estavam 5 stacks no palco do MusicBox, uma parede composta por 5 pilares encimados por cabeços Ampeg e ainda duas misteriosas e pequenas unidades nas colunas do centro, cruzando-se com os dois SVT II PR e com colunas Marshall. É como um EQ gigante, cada pilar controla uma zona de frequências. Podem ler essa entrevista com SOMA (abre em novo separador).
Em 2019, a banda editou o épico díptico “Life Metal” e “Pyroclasts”. Durante as sessões desses álbuns, Stephen O’Malley e Greg Anderson trabalharam extensivamente na moldagem dos seus sons, de forma a criar um espectro de energia mais amplo sobre a potente saturação de som que lhes é habitual. A dupla trabalhou em conjunto com Steve Albini e o resultado final é deveras impressionante. O som respira e oprime, oferece luminosidade e cor, mas também sombras. Sente-se sintético e orgânico. A aclamada compositora e violoncelista Hildur Guðnadóttir (que escreveu a OST de “Joker”), entre outras coisas, empresta a voz ao colossal tema “Between Sleipnir’s Breaths”.
Os SUNN O))) não actuam em Portugal desde 2013. Os bilhetes para a edição 2023 do Amplifest estão à venda, pelo preço de €99, no site oficial da Amplificasom.
