O ubíquo Yamaha DX7, as lendas da Roland ou máquinas pioneiras como a Oberheim DMX e a Linn LM-1. Estas foram as unidades que criaram o som da vibrante década de 80.
Quem é da geração de apenas dois canais de televisão sabe que uma das principais iniciações ao universo da música (para além da colecção de vinil dos pais/irmãos mais velhos e das ondas hertzianas) foram as diversas variações de programas ao estilo “Top+”. É lógico que, sendo a bitola da programação aquilo que havia sido mais vendido ao longo da semana, não haveria grande hipótese de por ali encontrar o estranho, o independente, o improvável. Era uma mistura dominical de pop sintetizado, hair metal de guitarras em V ou baladas acústicas, cantores soul em versão techno funk ou vice versa.
No entanto, talvez seja o saudosismo a falar, tudo tinha um certo carácter, sentia-se a exploração de possibilidades e o exotismo sónico como nunca. Estávamos nos anos em que a música electrónica já não era uma peculiariedade, mas a tendência crescente. Todavia, talvez porque não tinha sido ainda cumprido o distancioamento geracional, promovendo a nostalgia, durante algum tempo, parecia que os anos 80 tinham sido a década que os revivalistas musicais tinham optado por ignorar. A sabedoria convencional tinha-a de que os seus discos eram tipificados por produção exagerada e sons digitais.
Isso está a mudar rapidamente, não só no que concerne à música, mas também à mímica cultural e visual, à moda e à tecnologia – agora ressuscitada em software mais poderoso. O crescentemente popular synthwave e fenómenos como Stranger Things estão a trazer de volta a década de 80 e em grande estilo. Nesse sentido, eis algumas máquinas que nos deram os sons que definiram uma década.

OBERHEIM DX/DMX | Esta drum machine foi a resposta da Oberheim à LM-1 Drum Computer. Ainda que não tivesse um carácter tão demarcado como a caixa de ritmos clássica de Roger Linn, conseguiu criar a sua reputação dentro das tabelas de vendas do new wave, hip-hop e pop da época. Tal como a Linn, a DMX possuía samples de baterias reais. 24 samples, para ser exacto. Embora a selecção fosse anémica para os padrões actuais, os utilizadores podiam extrair muita variedade dos samples incluídos, graças a especificações tão sofisticadas como a capacidade de ajuste dos samples e oito saídas separadas para processamento individual. Melhor ainda, foram disponibilizados sons alternativos em chips EPROM e até se podiam gravar os que utilizador criasse, com o Oberheim Prommer. Parte do ‘System’ da Oberheim, esta máquina esteve disponível em três encarnações: DMX; a simplificada DX; e a mais complexa Stretch DX. O tema mais famoso em que podem ouvir os seus beats é também um dos mais celebrados hits da década, “”Blue Monday”, dos New Order.
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ROLAND D-50 | Um pouco de reverberação pode fazer maravilhas. Nos anos 80 isto era ainda mais verdade. E não era um pouco de reverberação. Era Muita reverberação. O D-50, blockbuster da Roland, de 1987, com a sua combinação de ataques 8-bit, loops e formas de onda sintetizadas, foi o instrumento que verdadeiramente desencadeou a paixão da indústria musical por synths baseados em samples. Foi, e continua a ser, um instrumento com um som impressionante. Os programadores fizeram um trabalho magnífico, criando sons que instantaneamente se tornaram marcantes e inspiradores, muito graças aos efeitos de reverb incluídos e, muitas vezes, generosamente aplicados para esconder alguns sons e loops manhosos. Hoje em dia, estas mesmas limitações podem ser vistas como “de carácter”. Michael Jackson foi um dos seus milhares de fãs e usou o D-50 abundantemente em “Bad”.
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PPG WAVE 2.2/2.3 | Pequena empresa alemã, a PPG foi fundada por Wolfgang Palm e teve a ajuda (pelo menos financeira) dos pioneiros da música sintetizada Tangerine Dream. Os instrumentos Wave 2, 2.2 e 2.3 abdicaram de usar osciladores analógicos, substituindo-os por samples de wavetables, seguidos por filtros analógicos tradicionais e VCAs. Os osciladores digitais de Palm eram low-res, bastante sujos e granulosos areia, muito contribuindo, como tantas vezes sucede nestes casos, para o carácter distinto dos Wave: com uma aspereza industrial, um som algo metalizado com um tremendo grave. O seu legado persistiu numa gama de synths da Waldorf, que recorre a tecnologia de Palm, mas a sua verdadeira essência atravessará as eras como um dos protagonistas do álbum “Grace Under Pressure”, dos Rush.
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NEW ENGLAND DIGITAL SYNCLAVIER | Surgido no final dos anos 70, o Synclavier tornou-se parte da mobília de qualquer estúdio de elite que se prezasse no início dos anos 80. Acessível apenas aos ricos e famosos, este sistema integrado apresentava samplagem 16 bits, FM e síntese adicional e gravação digital integrada. Era até possível imprimir-se pautas com o raio da coisa. Hoje, tudo isto parece meio banal, mas no início dos anos 80 possuir um poder desta magnitude poderia obrigar alguém a hipotecar a casa. Só para finórios como Daryl Hall e John Oates e o seu álbum de 1984, “Big Bam Boom”.
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ROLAND JUPITER-8 | Quando alguém diz que os grandes sintetizadores analógicos foram produzidos na década de 70, está a esquecer-se do Jupiter-8. Esta linda máquina foi o glosioro epílogo dessa era, combinando e refinando tudo o que tinha sido feito até aí. Apenas foram construídas 2000 unidades, mas isso foi mais que suficiente para deixarem uma marca indelével na música dos anos oitenta. Com oito vozes, que podiam ser divididas e estratificadas através do teclado, dois VCOs por voz, filtros de agudos e graves e saídas XLR, o Jupiter não tinha só classe sónica, mas uma enorme capacidade de trabalho. Versões posteriores passaram ainda a integrar a interface DCB da Roland, para que se pudesse fixar-lhe um MC-4 Microcomposer. Também era possível sincronizar o arpeggiator com caixas de ritmo da Roland, uma maravilha naqueles tempos pré-MIDI. Hoje em dia, o Jupiter-8 está a tornar-se cada vez mais raro. A Roland revitalizou-o digitalmente e através das Boutique Series. É apenas o sintetizador principal do álbum “Thriller” e a desculpa perfeita para partilhar mais um mini-filme de Michael Jackson…
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ENSONIQ MIRAGE | Samples 8 bit, com uma taxa de samplagem máxima de 32 kHz, 333 notas de sequenciamento, 144 kilobytes de RAM e uma drive de disquetes de dupla densidade. É quase uma anedota… Uma anedota que vendeu mais de 30 mil unidades! Apontados aos ricos, Fairlights, Synclaviers e Emulators renderam milhares de dólares. A Ensoniq provocou um terramoto na indústria de sintetização dos 80s, vendendo o Mirage abaixo dos dois mil dólares. Com polifonia de oito vozes, um teclado sensível à velocidade, divisões, camadas e um filtro analógico ressonante, o Mirage retirou a samplagem profissional da estratosfera e ofereceu-a aos mortais comuns. Foram necessários compromissos, obviamente. Toda a programação era feita com um punhado de botões e um mísero visor hexadecimal de dois dígitos. Para compensar alguma falta de poder, era possível integrar interfaces de software externos, que facilitavam a samplagem. Na verdade, o Mirage permanece invulgar na sua capacidade de carregar sistemas operacionais de terceiros – o excelente SoundProcess (ainda disponível em www.syntaur.com) continua a ser um bom exemplo, transformando o Mirage num sintetizador digital multitímbrico de 16 canais. Hoje em dia subsiste mais no universo do hip hop, devido ao ser carácter comprimido. Nos seus tempos de glória, Janet Jackson usou-o no álbum de ’86, “Control”.
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YAMAHA DX7 | Se os sintetizadores eram usados ao pontapé nos anos 80, nenhum terá sido tão usado como este lendário modelo da Yamaha, que ultrapassou as 160 mil unidades vendidas entre 1983 e 1987. Foi o primeiro synth a atingir uma merca desta magnitude. A sua síntese FM totalmente digital FM começou por adquirir a injusta reputação de ser difícil de programar. Mas, mesmo que esse fosse o caso, a maioria dos utilizadores ficava mais que satisfeita apenas com a possibilidade de explorar as predefinições de fábrica. Depois de anos de sintetizadores exclusivamente analógicos, os músicos abraçaram os sons suaves e cristalinos do DX7 e, durante um tempo considerável, o éter era preenchido com os seus sinos FM, emulações digitais de Rhodes e graves arrojados. A Yamaha espremeu até ao osso toda tecnologia que o seu custo de produção podia oferecer e acabou por mudar o jogo, forçando as outras marcas a reverem os seus processos e custos de produção. O seu mais ilustre utilizador terá sido o mega produtor Brian Eno, que construiu as atmosferas de “The Joshua Tree” com o DX7. Bom, Prince também o usou em “Purple Rain”. Na verdade, podem ouvi-lo em quase tudo o que usava sintetização a partir de 1983…
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FAIRLIGHT CMI | Criado pelos designers australianos Kim Ryrie e David Vogel (a partir de tecnologia licenciada pelo engenheiro Tony Furse), o CMI Fairlight entrou em cena em 1979. Inicialmente concebido como uma workstation de síntese, foi a tecnologia de samplagem que lhe granjeou a reputação e, durante a década seguinte, o Fairlight passaria por um punhado de encarnações, numa evolução exponencial. Finalmente, chegarian à capaciadde de samplagem 16 bit, com rácio total de 100 kHz, e a memória a poder ser expandida para quase trinta minutos de tempo de sample. É obra! Havia também síntese FFT e edição de forma de onda através de uma combinação vinda do futuro, uma caneta luminosa e um ecrã para desenhar o formato de onda. O sequenciador Page R da Fairlight era quase tão popular como o seu sampling, oferecendo um Rhythm Sequencer e um sequenciador polifónico de 80 pistas. Isto era o melhor da tecnologia nos anos 80 e, por isso, caríssima. Era só para a elite, como os Yes no álbum “90125”.
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E-MU SYSTEMS EMULATOR | Em 1981, inspirado pela secção de sampling do CMI Fairlight, o efeito de delay no sampling do LM-1 e do Publison, Dave Rossum propôs-se a conceber um instrumento especificamente dedicado à samplagem, mas bem mais barato (se é que 10 mil dólares era “bem mais barato”), com 8 vozes. As primeiras versões careciam de filtros ou mesmo de um VCA adequado. Se soltassem uma tecla durante a fase de ataque, o som continuaria a tocar ao longo de toda a duração do sample. Felizmente, alguns ajustes chegaram rapidamente, como o referido VCA em falta, um filtro e um sequenciador em tempo real. Escusado será dizer que o instrumento ganhou outra aura, por isso surge nesta lista, passando a ser usadíssimo por ases como Stevie Wonder (que conseguiu o primeiro modelo), Vangelis e Jean Michel Jarre, que aqui mostramos em “ZooLook”.
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LINN ELECTRONICS LM-1 DRUM COMPUTER | Até ao surgir a LM-1, as caixas de ritmo eram também caixas de granel, cheias de estalidos, zumbidos e sibilâncias. Antes da criação de Roger Linn, todas as drum machines produziam os seus sons através de síntese analógica à moda antiga. A maioria eram dispositivos de ritmo predefinidos e não programáveis, com muito pouco para oferecer ao mundo criativo da música e ainda menos ao mundo dos estúdios profissionais – talvez com excepção para a arcana CR-78 da Roland. Com sons samplados de bateria a 8 bit, que podiam ser ajustados pelo utilizador, a capacidade de armazenar 100 patterns programáveis e oito canções, para não mencionar o seu groove (coisa de ghosts in the machine), a LM-1 finalmente deu aos músicos profissionais as ferramentas de que necessitavam para produzir faixas de ritmo com qualidade para o estúdio. Reza a história que as anedoats de bateristas começaram aqui… Em retrospectiva, a tentação é menosprezar o impacto daquela escassa dúzia de sons samplados (sim, apenas 12) a 28 kHz e intencionalmente não filtrados. Todavia, eram surpreendentemente musicais e, nas mãos de um bom programador, extremamente convincentes. O custo rondava os cinco mil paus e, por isso, apenas foram vendidos 500 modelos. No entanto, foram mais que suficientes para moldar o som e a orientação tecnológica da década. Mudaram tudo! Ainda assim, muito poucos instrumentos definiram o som e a direcção tecnológica dos anos 80 da mesma forma que a LM-1. Segue-se o documentário de Peter Gabriel a criar o seu quarto álbum, “Security”, no qual a LM-1 foi um dos pilares.
Artigo traduzido e adaptado don original de Scot Solida (Future Music), para a MusicRadar.
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